[etnolinguistica] construção de uma grafia uniformizada para os dialetos Timbira do Maranhão e Tocantins

Flavia de Castro Alves pahno at IEL.UNICAMP.BR
Thu Feb 5 13:25:32 UTC 2004


Prezados colegas,

sou aluna de doutorado da Unicamp e, desde 1994, estudo a língua Timbira
falada pelos Canela Apãniekrá. Também presto assessoria lingüística
ao Projeto de Educação Escolar Timbira desenvolvido pelo Centro de
Trabalho Indigenista (CTI) junto a algumas aldeias de seis povos Timbira
(Krahô, Apinajé, Krikatí, Gavião (Pykobjê), Canela Apãniekrá e Canela
Ramkokamekrá).

Escrevo porque gostaria noticiar o momento histórico vivenciado pelos
representantes da Comissão de Professores Timbira, reunidos no Centro de
Formação de Professores Timbira Pënxw`yj Hëmpejx`y, durante a
Oficina de Grafia Timbira, realizada na cidade de Carolina (MA), de 8 a 14
de dezembro de 2003.

Com muita discussão, votação e aprovação dos grafemas, os professores
indígenas representantes dos povos Krahô, Apinajé, Krikatí, Gavião
(Pykobjê), Canela Apãniekrá e Canela Ramkokamekrá começaram a
construção de uma grafia uniformizada para esses dialetos da língua
Timbira. (Os Apinajé, embora do ponto de vista cultural possam ser
considerados um povo Timbira, falam uma outra língua, a língua Apinajé.
No entanto, do ponto de vista dos Timbira, há que se chamar atenção para
o fato de que a identidade lingüística é o mais importante símbolo da
identidade coletiva entre todos os povos Timbira (incluindo aí os
Apinajé)).

Considero essa Oficina um momento histórico na vida da Comissão de
Professores Timbira porque foram eles sim os autores da grafia. O meu
trabalho, como lingüista, foi falar sobre os sistemas de escrita serem
convenções, de mostrar o mecanismo de elaboração de uma escrita, de
mostrar onde é que eles estavam escrevendo diferente e/ou igual (porque
com ou sem sistematização de uma grafia, eles já vinham escrevendo!), de
provar que eles é que são os mais bem autorizados a propor e discutir uma
escrita para a sua língua e, ainda, de provocar e mediar a discussão.
Importante dizer que sempre deixo claro nos encontros que tenho
com os Timbira (cursos, oficinas, trabalho de campo etc), que o lingüista
é um pesquisador da língua, e não uma Autoridade. Assim, as decisões
sempre foram deles, inclusive com generalizações bastante interessantes
(do meu ponto de vista de lingüista).

Ainda há muito trabalho pela frente, mas acredito que o grande passo eles
já deram, que é o de serem e o de se sentirem os autores da proposta de
escrita. Um exemplo disso é que, quando começávamos a testar a proposta,
os professores se levantaram, foram para o quadro e de lá não saíram
mais. Para os Timbira, é muito ruim se expor, mesmo que eles queiram falar
alguma coisa porque sabem, eles não falam se não estiverem autorizados ou
se isso parecer arrogante. Por isso, quando eles se levantaram e assumiram sua
posição de habilitados para esse assunto é porque de fato eles já se
reconhecem e já são reconhecidos como tal.

A seguir apresento a tradução (feita pelo Cornélio Pëapëte Canela, da
Aldeia Escalvado) da carta de apresentação da proposta de
escrita para a comunidade (que encaminhava o todo o material produzido por
eles durante a Oficina):

"Pënxw`yj Hëmpejx`y, 14 de dezembro de 2003.

Bom minha comunidade, a partir de hoje nós que somos professores nos
unimos e nós combinamos entre nós para fazer essa grafia (uniformizada),
para que nós podemos se entender melhor através da escrita,
principalmente o povo que fala a mesma língua.

Antes teve lá em São Paulo com essas pessoas P`ynhë, Tep-hot, Höjawën,
Cöjam, Pëk~en, Kr~y'hy, Pëhöc, Jahët, Cöxet, K~en, no ano de 1995,
para podermos escrever igualmente. Por isso uniformizamos essas grafias e
fizemos uma só escrita para que nós podemos se entender melhor.

E nós vamos mostrar essa escrita para vocês verem e entenderem. A escrita
não pode mudar a fala da comunidade, continua falando do mesmo jeito. E
primeiro nós fizemos como experiência (mais ou menos 350 palavras) para
vocês lerem e terem uma idéia e corrigirem.

São essas pessoas que fizeram:
Cornélio Pëapëte, Jonas P`ynhë, Mário Prõjapë, Neide Apinajé, Joel,
Iramar, Diana, Ari Karömpej, Edmar, Célio, Creuza Pr~umkw`yj, Sabino
Cöjam, Iltom I'pr`y, Gregório H~u'të, Benedito H`yc, Anelivaldo Pëhöc,
Boaventura Xwaxwa, Dórcio Hõ'hë, Zé Antônio Xëkaprö, Rosane Cö'tetet e
Flávia Pa'nõ."

Para terminar, gostaria de parabenizar novamente os professores da
Comissão de Professores Timbira por mais essa conquista.

Com um grande abraço,

			Flávia
















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