<html><body>


<div><font face="Arial" size="2">
<p class="materiaTitulo">Matéria publicada na revista <em>Época</em> (Edição 431, 
ago/06). Além do Xipaya, a matéria menciona o Araweté. Entre os entrevistados 
estão, além de Maria Xipaya, os lingüistas Carmem Lúcia Rodrigues (UFPA), Aryon 
Rodrigues (UnB) e Denny Moore (Museu Goeldi). O conteúdo integral da matéria 
(incluindo fotos e vídeo) pode ser acessado no seguinte endereço:</p>
<p class="materiaTitulo"><a href="http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG75091-6014-431,00.html">http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG75091-6014-431,00.html</a></p>
<p class="materiaTitulo"><strong>----------------------------</strong></p>
<p class="materiaTitulo"><strong>A última falante viva de xipaia</strong></p>
<p class="materiaOlho"><em>Quando Maria morrer, a língua de seus ancestrais estará 
morta. Dá para salvar um <br>idioma da extinção?</em></p>
<p class="materiaAutor"><font size="1">Tânia Nogueira (texto) <br>Frederic Jean 
(fotos), De Altamira</font></p>

<p>Na língua dos índios xipaia não há uma palavra para designar "ano". Essa 
unidade de tempo não existe na cultura da tribo. Por causa disso, Maria Xipáya 
nem sabe quantos anos tem. Na carteira de identidade que ganhou da Funai, a data 
de nascimento é 19 de abril de 1928. (Quando não se sabe o dia do aniversário, é 
padrão na entidade atribuir uma data aproximada. No caso dela, o Dia do Índio.) 
Maria mora numa casa localizada num bairro simples da cidade paraense de 
Altamira. Ela é a última falante viva de um idioma que está morrendo. Não tem 
ninguém com quem conversar em sua língua materna. Os demais xipaias já 
esqueceram boa parte do idioma. </p>
<p>"Quando eu morrer, morre comigo um certo modo de ver", escreveu o poeta 
Carlos Drummond de Andrade em um de seus poemas mais famosos, "Desfile". A 
frase, válida para seres humanos, serve também para idiomas. Quando morre uma 
língua, grande parte da cultura associada a ela desaparece. "Cada língua é uma 
cultura e uma visão de mundo", diz Aryon Dall'Igna Rodrigues, coordenador do 
laboratório de Línguas Indígenas da Universidade de Brasília (UnB) e um dos 
maiores especialistas brasileiros no assunto. Não é à toa que, em grego, uma 
mesma palavra - logos - significa linguagem e pensamento. </p>
<p>As línguas costumam morrer em silêncio. O principal sinal de envelhecimento é 
deixarem de ser ensinadas às novas gerações. Quando isso acontece, o final é 
quase irreversível. "Qualquer língua que não seja mais transmitida às crianças 
está em situação crítica", diz Aryon Rodrigues. Antropólogos e lingüistas 
acreditam que, se nada for feito, algo entre 50% e 90% das cerca de 6 mil 
línguas faladas no planeta vão desaparecer neste século. Quando Cabral chegou ao 
Brasil, a população de índios era de 6 milhões a 10 milhões segundo estimativas. 
Hoje, calcula-se que são 170 mil. Em 1500, os índios falavam cerca de 1.300 
línguas. Sobraram 181. </p>
<p>As línguas deixam de ser usadas quando seus falantes não precisam mais dela. 
Quem impede o desaparecimento completo de uma língua salva toda uma cultura e 
uma visão de mundo. s Os esquimós usam palavras diferentes para se referir a 
tonalidades de branco imperceptíveis para quem não vive na região Ártica. Se 
eles desaparecessem, essa diversidade cultural também sumiria. Por isso, um 
idioma salvo da extinção é motivo para comemorar. <br><br></p>
<p>No Brasil, salvar idiomas é especialmente importante dada a biodiversidade 
lingüística do país. Enquanto na Austrália os 200 idiomas indígenas catalogados 
são todos variações de uma única família, por aqui há várias famílias 
independentes. A maior parte delas pertence a dois troncos principais, o tupi e 
o macro-jê. A língua xipaia pertence ao tronco tupi. <br><br></p>
<p>Os xipaias deixaram de utilizar seu idioma quando abandonaram a tribo para 
viver na cidade. Recentemente, a Funai demarcou as terras dos xipaias e alguns 
deles voltaram a morar no mato. A aldeia fica a dez dias de barco de Altamira. 
Para lá seguiram 36 índios da etnia, nenhum deles com fluência no idioma nativo. 
</p>
<p>Alguns lembram de uma palavra ou outra, como os parentes mais próximos de 
Maria. Duas de suas primas, Izabel e Odete, se recordam de algumas frases em 
xipaia. Um amigo, João, conhece nomes de bichos e plantas na floresta. Mas isso 
seria insuficiente para manter um diálogo, caso eles se encontrassem com 
freqüência. Como são idosos, os quatro dificilmente saem de casa e se vêem 
pouco. Os filhos, netos e bisnetos de Maria não falam o idioma ancestral. </p>
<p>Embora seja difícil impedir a morte de uma língua, é possível evitar sua 
extinção. O latim é uma língua morta, pois não é mais falado. Mas não está 
extinto. Restam textos latinos que ainda são estudados e preservam a cultura que 
deu origem a vários idiomas vivos. Da mesma forma, o xipaia pode morrer, mas não 
será extinto. Desde 1988, a professora de Lingüística da Universidade Federal do 
Pará (UFPA) Carmen Lúcia Reis Rodrigues trabalha ao lado de Maria Xipáya. Ela 
registra o vocabulário, presta atenção a nuances fonéticas, tenta entender as 
regras gramaticais e está criando uma ortografia para o idioma. Ainda neste ano, 
Carmen pretende finalizar um dicionário. O xipaia era dado como extinto até os 
anos 80. Foi quando Carmen, então estagiária do Museu Paraense Emílio Goeldi, e 
o lingüista americano Denys Moore descobriram Maria e viram uma oportunidade de 
salvar o idioma de seus ancestrais. </p>
<p>O nome xipaia aparece em relatos dos primeiros missionários e viajantes que 
chegaram à região dos rios Xingu, Iriri e Curuá, no Pará, no século XVII. Em 
2002, eram apenas 595 pessoas. A família de Maria parece pertencer a um grupo 
que se manteve relativamente afastado dos costumes dos brancos. Ela afirma que, 
até o dia s de seu primeiro casamento, jamais tinha entrado numa igreja e que, 
até então, não era batizada. O tio de Maria, Durica, era o pajé da tribo. Sua 
filha, Izabel, prima de Maria, afirma que costumava vê-lo incorporando espíritos 
e fazendo suas curas. Uma vez Maria diz que passava muito mal do estômago. O 
pajé foi chamado e disse que ela tinha ingerido a comida de uma panela que 
ficara aberta durante a noite. "O bicho da escuridão tinha cuspido lá dentro", 
diz ela. Ela afirma que, depois das rezas e dos remédios do tio, ficou boa. </p>
<p>Na época do Ciclo da Borracha, no século XIX, e durante a Segunda Guerra 
Mundial, os seringueiros usaram os xipaias e os curuaias, outra tribo da região, 
como guardas dos assentamentos de seringueiros na selva. Foi aí que começou o 
contato com a cultura dos brancos. Quando criança, Maria diz que se fascinava 
com o modo de vida dos que falavam português: "Eu achava bonito. Aquelas roupas 
limpinhas, branquinhas, tudo arrumado. As meninas me chamavam para ajudar a 
lavar roupa. Eu adorava. Queria que minha mãe fosse como a mãe delas, que não 
comesse na folha de bananeira e depois jogasse no meio do mato".</p>
<p>O chamado da civilização parecia irresistível. Depois da folha de bananeira, 
a jovem Maria foi, aos poucos, desprezando os trajes tradicionais, as pinturas 
indígenas, as danças e, por fim, o próprio idioma. Quando seus filhos nasceram, 
ela não se preocupou em passar a língua do pai ou da mãe para eles. Hoje se diz 
arrependida e se esforça ao máximo para alimentar a pesquisadora com dados sobre 
o idioma xipaia. </p>
<p>Sempre que Carmen Rodrigues consegue se deslocar de Belém a Altamira, o que 
não é tão freqüente, Maria passa as tardes com ela gravando histórias, 
identificando palavras, repassando textos, lembrando de canções de sua aldeia. À 
noite, quando tudo se aquieta, ela diz lutar para recapturar as palavras de 
mitos narrados pelo pai, as letras de músicas cantadas em torno do fogo, um 
diálogo qualquer perdido na memória. </p>
<p>Salvar uma língua indígena da extinção é um desafio complexo. É necessário 
estabelecer uma ortografia para ela, já que esses idiomas são orais. É desejável 
também que se estude a língua antes de ela ir para a UTI, reduzida a poucos 
falantes. Carmen Rodrigues, além do xipaia, pretende estabelecer uma ortografia 
para outro idioma, o araueté. </p>
<p>Os arauetés vivem no igarapé Ipixuna, à margem Rio Xingu, no Pará. Para 
chegar à aldeia, são oito horas de barco com motor de popa a partir de Altamira, 
a cidade mais próxima. Os pouco mais de 350 moradores da aldeia mantida pela 
Funai mantêm sua língua e boa parte de sua cultura preservadas. Ainda vivem da 
pesca, da caça, da fabricação de farinha de mandioca, da extração da castanha. 
As mulheres tecem suas saias e andam com os seios nus. Em noites de lua cheia, o 
povo dança e canta em torno do fogo. O pajé trata de picadas de cobra e 
problemas no joelho. De madrugada, pode-se ouvi-lo cantar. As famílias ainda 
comem em torno do fogo, sentadas na esteira. </p>
<p>Também se notam as primeiras marcas do contato com os brancos. Além de peixe 
e porco-do-mato, os arauetés hoje comem muito açúcar. Os homens não andam mais 
nus. Vestem short e camiseta. As filas do posto médico instalado na aldeia 
mostram que a fé no pajé já não é tão grande. A televisão, a que muitos assistem 
deitados no chão de terra, já é um dos lazeres principais da comunidade. "Não 
queremos perder nossa cultura e nossa língua", diz o cacique Tatuavim. Mas, como 
Maria na juventude, alguns arauetés mais novos têm dificuldade de entender que 
dá para conciliar o português com a língua ancestral. "Quando a gente começa com 
o português, vai esquecendo o araueté. O importante é o português", diz 
Ravutiré, de 16 anos. Ele é um dos informantes de Carmen Rodrigues em seu 
projeto. </p>
<p>Não se pode impor a qualquer grupo indígena a obrigação de manter sua cultura 
ou sua língua. "Em geral, s não é uma questão de escolha", diz a antropóloga. 
Além de tentar documentar as línguas para que não se perca a imensa riqueza 
cultural que elas representam, é possível dar condições econômicas e culturais 
para que esses povos decidam o que querem manter intocado e o que querem 
aproveitar de nossa cultura. O caminho, como em outras questões brasileiras, 
passa pela educação. <br><br></p>
<p>A Constituição de 1988 determina o ensino bilíngüe nas escolas de áreas 
indígenas brasileiras. Isso só é possível se os lingüistas conseguirem 
estabelecer as ortografias dos idiomas. Há muitos em campo atualmente no Brasil. 
Centros como o Museu Goeldi, a Universidade de Brasília, a Universidade Federal 
do Pará e a Unicamp desenvolvem trabalhos de pesquisa por todo o território 
nacional. Mas há mais línguas que lingüistas especializados. O espaço acaba 
sendo ocupado por missionários religiosos. Eles carregam a tradição, primeiro 
católica, depois evangélica, de estudar os idiomas indígenas para então 
transmitir as palavras da Bíblia aos infiéis. "Alguns missionários são muito 
competentes", diz Aryon Rodrigues. "Mas o objetivo deles em geral é apenas 
traduzir a Bíblia." </p>
<p>A língua portuguesa, que passa na TV, toca no rádio e aparece por meio da 
internet, é mais atraente para esses jovens. Para compensar um pouco dessa 
influência, o laboratório de lingüística do Museu Goeldi resolveu atacar com a 
mesma arma: a tecnologia. A instituição grava DVDs com danças, produz material 
audiovisual sobre os métodos de caça e distribui CDs com músicas tradicionais. 
Parece funcionar. "Eles ouvem, ouvem e ouvem", diz o lingüista Danny Moore. "Os 
ticunas, por exemplo, já nos pediram para gravar CDs para seus filhos pequenos 
escutarem." </p>
<p>No passado, predominava entre os antropólogos uma visão paternalista, segundo 
a qual o contato entre os índios e os brancos era sempre danoso para as suas 
culturas. Hoje se admite que aprender a língua oficial do país - o português - é 
não só inevitável, como também desejável. O caminho, segundo os especialistas, é 
despertar nos índios o desejo de valorizar também a própria cultura. E 
iniciativas como a do Museu Goeldi são um passo decisivo nessa 
direção.</p></font></div><br clear="all">--------------------<br>Etnolinguistica.Org<br>Setor de Etnolingüística, Museu Antropológico/UFG<br>Av. Universitária, 1166, Setor Universitário <br>74605-010 Goiânia, Goiás, BRASIL
<br><a href="http://www.etnolinguistica.org/">http://www.etnolinguistica.org/</a>

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IV Encontro da Associação Brasileira de Estudos Crioulos e Similares<BR>
Goiânia, 18 a 20 de outubro de 2006<BR>
Participe! Para maiores informações, visite<BR>
<a href="http://www.letras.ufg.br/abecs.html">http://www.letras.ufg.br/abecs.html</a><BR>
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O uso dos recursos do grupo Etnolingüística baseia-se no reconhecimento e aceitação de suas diretrizes. Para conhecê-las, visite <a href="http://geocities.com/linguasindigenas/normas">http://geocities.com/linguasindigenas/normas</a> </tt>
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