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<p>Desculpe-me o João Carneiro, mas não se confundam as coisas.<br>
A Babilônia "religiosa" (melhor dizendo, a barafunda de denominações<br>
degladiando-<wbr>se nas áreas indígenas > algumas suportam 10 ou mais seitas)<br>
não é e não pode ser vista como sinal de qualquer "avanço" ou mudança<br>
positiva para os povos indígenas.<br>
Por que não ver como retrocesso, então, o fato de que nossas sociedades (e<br>
seus religiosos dedicados, de qualquer denominação)não é capaz de aceitar<br>
a verdade da fé dos povos indígenas? A razão óbvia é: o princípio<br>
missionário é um princípio colonialista!<br>
E só faltava essa: o velho papo que o Summer usou por tanto tempo, de que<br>
a tradução do Novo Testamento ou qualquer livro bíblico era um "acervo"<br>
valioso de língua indígena. Me desculpe, mas isso sempre foi descarada<br>
desculpa para não fazer outra coisa, mais útil, em prol das línguas<br>
indígenas.<br>
<br>
Wilmar da Rocha D'Angelis<br>
lingüista - UNICAMP<br>
<br>
> Caríssimos,<br>
><br>
> Sobre toda esta discusão, crei que o único consenso seja que não vivemos<br>
> em um mundo estático, tudo está em movimento e as sociedades indígenas<br>
> fazem parte deste todo. Lembro-me que nesta lista foi comemorado o fato de<br>
> termos o primeiro indígena Doutor em Letras ou Lingüística, ora, este<br>
> universo científico também não fazia parte do mundo indígena e agora faz.<br>
> Assim como, antes, não existiam índios missionários e agora há,<br>
> entretanto, este fato nós não comemoramos, apenas rechaçamos.<br>
> Diante disto, creio que haja uma certa falta de reflexão sobre o nosso<br>
> próprio trabalho junto a essas comunidades.<br>
> Respondendo a questão do Eduardo existe entre os Wapixana de Roraima um<br>
> senhor wapixana, que hoje deve estar com 87 anos, que traduziu o novo<br>
> testamento para a língua wapixana. Não tenho elementos para dizer se a<br>
> tradução é boa ou ruim, só sei que a base para a tradução foi uma edição<br>
> de bolso feito para os jovens de linguagem bem simplificada. Como<br>
> resultado, independente das quentões religiosas, temos um imenso<br>
> inventário lingüístico (wapixana) reunindo mais de 300 páginas, que podem<br>
> dar margem a diversas análises, lingüísticas, antropológicas, etc.<br>
><br>
> Abraços<br>
><br>
> João Paulo Jeannine A. Carneiro<br>
><br>
> ----- Original Message -----<br>
> From: Eduardo Ribeiro<br>
> To: <a href="mailto:etnolinguistica%40yahoogrupos.com.br">etnolinguistica@<wbr>yahoogrupos.<wbr>com.br</a><br>
> Sent: Friday, October 05, 2007 8:34 PM<br>
> Subject: [etnolinguistica] Missionários, lingüística indígena e a bíblia<br>
><br>
><br>
> Caros colegas,<br>
><br>
> A mensagem do Sandro tem o mérito de ampliar a discussão. Afinal, a<br>
> atuação de lingüistas missionários é apenas uma faceta das relações<br>
> entre pesquisadores em geral e as comunidades indígenas (e, não menos<br>
> importante, o papel histórico do Estado e da própria academia). Se<br>
> queremos avaliar estas questões de maneira racional, é bom que levemos<br>
> em consideração os fatos e nos abstenhamos de alusões históricas pouco<br>
> relevantes. Falar da inquisição, mencionar os crimes cometidos em nome<br>
> de Deus, pode até vir ao caso, se estamos prontos para admitir também<br>
> que alguns dos piores crimes dos últimos séculos foram cometidos em nome<br>
> da ciência (ou pseudo-ciência)<wbr>. Fanatismo, seja com verniz religioso ou<br>
> científico, é sempre uma má idéia.<br>
><br>
> Criticar missionário é tarefa fácil. Mais fácil ainda (dado o ambiente<br>
> favorável) é formar um coro anti-missioná<wbr>rio, com palavras de ordem,<br>
> "fora isso", "basta daquilo", à la PC do B. Mas não nos esqueçamos que<br>
> esta é uma lista de discussão sobre o estudo científico de línguas<br>
> indígenas; eu, como assinante da lista, esperaria que cada mensagem<br>
> contribuísse com um mínimo de informação adicional, que seja relevante<br>
> para os demais usuários. Opiniões são, naturalmente, bem vindas, mas é<br>
> bom que sejam motivadas por preocupações concretas, calcadas na<br>
> experiência profissional de cada um (como Renato Athias, em sua mensagem<br>
> original, fez). Uma aversão pessoal, pura e simples, a missionários, ou<br>
> à religião, não seria razão suficiente. Do contrário, corremos o risco<br>
> de cairmos no simplismo -- que é, infelizmente, o rumo que esta<br>
> "discussão" está tomando, na minha opinião.<br>
><br>
> Lamentar que as culturas indígenas estejam mudando é ignorar o óbvio:<br>
> toda e qualquer cultura muda (e tentativas de mantê-las puras facilmente<br>
> descambam para o fascismo). Por mais paradoxal que isto pareça, mudança<br>
> pode ser um sinal de vitalidade cultural. Basta dar uma olhada nos<br>
> vários empréstimos pré-colombianos espalhados pelas línguas do<br>
> continente para ver que, por mais "isoladas" que tais culturas fossem,<br>
> sempre havia intercâmbios culturais -- e, com eles, mudança. Lamentável<br>
> é quando tais mudanças se dão por imposição, seja à força de armas ou do<br>
> poderio econômico. Neste caso, a principal crítica que tenho com relação<br>
> aos missionários diz respeito ao seu oportunismo: acabam se beneficiando<br>
> das vicissitudes históricas dos índios (massacres, doenças, penúria,<br>
> descaso das autoridades) para atingir seus objetivos. O que aconteceria<br>
> se ambas as culturas se encarassem como iguais?<br>
><br>
> Uma questão que considero interessante, no caso de traduções bíblicas,<br>
> diz respeito ao grau de adaptação cultural alcançado (ou alcançável).<br>
> Imagino que, entre os evangélicos, haveria pouco espaço para isto,<br>
> embora eu desconheça as possíveis regras que norteiam seus esforços de<br>
> tradução (alguém saberia?). E como os textos são traduzidos por<br>
> missionários estrangeiros, vindos de uma tradição cultural completamente<br>
> alheia, o texto bíblico acaba sendo uma espécie de aberração -- uma<br>
> pereba cultural, digamos. Este parece ser o cenário mais comum, mas<br>
> estou interessado em exemplos de um cenário alternativo: traduções,<br>
> parciais que sejam, feitas espontaneamente por falantes nativos (sem a<br>
> coordenação de indivíduos alheios à comunidade). Haveria exemplos deste<br>
> tipo, no caso das Américas?<br>
><br>
> Abraços,<br>
><br>
> Eduardo<br>
> (<a href="http://kawina.wordpress.com">http://kawina.<wbr>wordpress.<wbr>com</a>)<br>
><br>
><br>
><br>
><br>
> On 10/4/07, C. Sandro Campos <<a href="mailto:csampos%40yahoo.de">csampos@yahoo.<wbr>de</a> > wrote:<br>
> Ainda apenas para botar mais lenha na fogueira que acenderam, gostaria<br>
> de fazer uma pergunta que não me deixa em paz: a presença intensa de<br>
> pesquisadores em áreas indígenas, a profusão de projetos sobre vários<br>
> temas propostos aos índios, criação de cursos universitários,<br>
> surgimento de cargos remunerados de professores nas aldeias, manejo<br>
> com câmeras, encontros indígenas, além do surgimento entre os índios<br>
> de uma espécie de filosofia de levar vantagem em tudo (conseqüência<br>
> talvez das nossas constantes e lucrativas ofertas) não são também tão<br>
> nefastos quanto a tentativa por missionários de levar aos índios "a<br>
> mensagem de Deus"? Faço a comparação porque, como vejo, também essas<br>
> ações que fazemos acontecer descaracterizam a cultura e a rotina dos<br>
> índios...<br>
> Adianto que não sou religioso e muito menos missionário, quero apenas<br>
> debater sobre o tema de modo mais crítico.<br>
> Aguardo...<br>
><br>
> Valdir Vegini < <a href="mailto:vvegini%40gmail.com">vvegini@gmail.<wbr>com</a>> schrieb:<br>
><br>
> Apenas para botar mais lenha na fogueira, aqui força de expressão e<br>
> não aquele método milhares de vezes utilizado pelos catesquisas<br>
> durante longo período da cristianização das almas atéias: quando<br>
> Colombo chegou às Índias Ocidentais notou que os "selvagens" viviam<br>
> em harmonia e felizes, mas faltava-lhes a conversão ao cristianismo!<br>
> Pra quê? Recentemente, o banzer do Vaticano afirmou os indígenas<br>
> foram atraídos e não catequisados. Alguém ainda acredita nisso além<br>
> dos vaticanólogos?<wbr>?????????<br>
><br>
><br>
> Em 01/10/07, Victor A. Petrucci <<a href="mailto:vicpetru%40hotmail.com">vicpetru@hotmail.<wbr>com</a>> escreveu:<br>
> Caros Amigos Listeiros<br>
><br>
> Mais de uma vez pronunciei-me sobre a presença de missionários em<br>
> terras indígenas e quanto mais leio e pesquiso mais tenho certeza<br>
> de<br>
> que isso é inaceitável. A tentatíva espúria de substituir o<br>
> Estado, de<br>
> dar apoio às carências de nossos irmãos indígenas é apenas a cunha<br>
> para dominá-los com as idéias também espúrias de um deus<br>
> alienígena.<br>
><br>
> É necessário nos posicionarmos claramente sobre isso.<br>
><br>
> Defender suas culturas, preservar suas línguas são ações<br>
> incompatíveis<br>
> com um trabalho missionário catequético. Sabemos que essa<br>
> catequese é<br>
> radical e interfere profundamente na vida das comunidades.<br>
><br>
> Veja o trecho de uma brilhante tese de mestrado recentemente<br>
> divulgada<br>
> em nossa lista, dedicada ao estudo da fonologia Taurepang, que nos<br>
> dá<br>
> um exemplo real do que ocorre:<br>
><br>
> "2.5 - A evangelização e sua importância na vida dos índios<br>
> Taurepang"<br>
><br>
> "No que se refere à religião, os Taurepang do lado brasileiro são<br>
> praticantes da religião Adventista do Sétimo Dia. Os dias de<br>
> sábado<br>
> são guardados zelosamente para a prática do culto, que ocorrem em<br>
> língua indígena e em português ou espanhol, dependendo da<br>
> competência<br>
> comunicativa dos falantes. A vida deste grupo está marcada pelas<br>
> outrinas e atividades da igreja. Da mesma forma, os hábitos<br>
> Alimentícios são orientados por meio da religião. A prática<br>
> adventista<br>
> proíbe-lhes a pajelança, antiga prática xamanística anterior ao<br>
> contato com os missionários, que consiste na invocação dos<br>
> espíritos<br>
> para promover um ato de cura..."<br>
><br>
> KATIA NEPOMUCENO PESSOA (2006 - RECIFE)<br>
><br>
> FONOLOGIA TAUREPANG E COMPARAÇÃO PRELIMINAR DA FONOLOGIA DE<br>
> LÍNGUAS DO<br>
> GRUPO PEMÓNG (FAMÍLIA CARIBE<br>
><br>
> Katia parabéns por sua coragem de tocar no assunto.<br>
><br>
> Exemplos como este existem às centenas. Alguém pode imaginar uma<br>
> cultura sem pajelança? O que significa uma comunidade indígena com<br>
> regras alimentares impostas sem respeito? O que significa ter que<br>
> banhar-se com roupa como os amigos citaram em mensagens<br>
> anteriores? O<br>
> que significa a presença nefasta de missionários no dia a dia das<br>
> comunidades?<br>
><br>
> Até quando vão nos empulhar com pílulas douradas quando vemos que<br>
> as<br>
> culturas estão sendo destruídas por fanáticos religiosos. Onde<br>
> está a<br>
> FUNAI que não aplica seus próprios estatutos?<br>
><br>
> Nossa mensagem frente a tais agressões e violações dos direitos<br>
> indígenas é uma só e volto a repetí-la nesta lista:<br>
><br>
> FORA COM A INTERFERÊNCIA RELIGIOSA NAS ÁREAS INDÍGENAS.<br>
><br>
> Estudar língua e cultura indígena é incompatível com alteração de<br>
> costumes da comunidade.<br>
><br>
> Um abraço a todos.<br>
><br>
> Victor A. Petrucci<br>
><br>
><br>
><br>
><br>
><br>
><br>
><br>
><br>
> ------------<wbr>---------<wbr>---------<wbr>---------<wbr>---------<wbr>---------<wbr>-<br>
> Yahoo! Clever - Sie haben Fragen? Yahoo! Nutzer antworten Ihnen.<br>
><br>
><br>
><br>
><br>
><br>
><br>
<br>
-- <br>
Wilmar R. D'Angelis<br>
Professor Doutor - Depto de Lingüística<br>
Instituto de Estudos da Linguagem - IEL<br>
UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas)<br>
Estado de São Paulo - Brasil<br>
<br>
</p>
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