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<p>Bom dia, Eduardo.<br>
Resta a questão de porque é natural que as nominalizações sejam <br>
ergativas ou que haja um pouquinho de ergatividade em todas as <br>
línguas. Por um lado, o padrão não é universal. Segundo a síntese <br>
tipológica de Koptjevsaja-<wbr>Tamm, as nominalizações de ação são <br>
ergativas em entre um terço e a metade das línguas do mundo. Em <br>
inglês mesmo existe uma nominalização "ativa" (1) ao lado da <br>
nominalização "passiva" (2) que mostra o padrão ergativo:<br>
(1) John's destruction of the city/John's arrival.<br>
(2) The destruction of the city by John/The arrival of John.<br>
Por outro, as explicações que conheço (ou posso imaginar) para a <br>
correlação entre nominalizações e ergatividade não são muito <br>
convincentes. Alexiadou faz uma bela descrição para terminar dizendo <br>
que sempre se nominaliza um verbo passivo, sem dizer porque. Dixon não <br>
diz nada, mas seria fácil estender a explicação "discursiva"<wbr>, de que <br>
o ergativo se usa em contextos em que o controle do sujeito sobre a <br>
ação é menor, algo tão circular quanto a explicação de Alexiadou.<br>
Acho que é uma omissão importante ter uma teoria para a ergatividade <br>
em orações finitas que não fale sobre a ergatividade em sintagmas <br>
nominais. Como você diz, Ludoviko e eu acreditamos que as formas <br>
verbais que ocorrem com o alinhamento ergativo são substantivos. <br>
Porém, ao menos em meu caso, isto é dito num contexto em que a <br>
distinção entre as partes do discurso é muito tênue, e em que a <br>
maioria dos predicados mostram unicamente um comportamento nominal/ <br>
adjetival, salvo certos temas semanticamente eventivos, que, além do <br>
comportamento nominal/adjetival, podem se combinar diretamente com a <br>
dêixis temporal para se transformarem em verbos finitos. Em qualquer <br>
língua (e há muitas) em que a distinção entre substantivos e verbos <br>
é tão tênue assim (e provavelmente semântica e não sintática), <br>
dizer que os predicados com alinhamento ergativo ou com semântica <br>
estativa são nominais é quase um petitio principii.<br>
Não me consta que tenhamos resultados empíricos sobre a <br>
superficialidade da ergatividade de origem nominal. É possível que <br>
ela nunca seja uma ergatividade sintática, mas nisto ela não seria <br>
diferente da maioria das construções ergativas oracionais. Há alguma <br>
outra área da sintaxe na qual teriamos que procurar conseqüências <br>
profundas do alinhamento ergativo?<br>
Em suma, questões interessantes que não convém por de lado.<br>
Saudações,<br>
Andrés<br>
<br>
On 13/03/2010, at 21:23, Eduardo Rivail Ribeiro wrote:<br>
<br>
> Olá, Flávia,<br>
><br>
> Minha opinião é que ergatividade em Jê Setentrional "is in the <br>
> eyes of the beholder." Alinhamento é, como você sabe, uma questão <br>
> de mais ou menos, não de tudo ou nada (todas as línguas que <br>
> conheço têm pelo menos um pouquinho de ergatividade)<wbr>. E, no caso <br>
> das línguas em questão, como eu venho dizendo, ergatividade é algo <br>
> superficial (sem conseqüências profundas em outras áreas da <br>
> gramática da língua) e epifenomenal (sendo efeito colateral da <br>
> nominalização). Há, no mínimo, tanta ergatividade quanto haveria <br>
> em inglês e latim. O único exemplo convincente de ergatividade <br>
> sintática que conheço em Macro-Jê continua sendo, como eu menciono <br>
> em meu artigo para a Encyclopedia of Language and Linguistics (<a href="http://www.wado.us/paper:ell2">http://www.wado.<wbr>us/paper:<wbr>ell2</a> <br>
> ), o Karirí.<br>
><br>
> Sim, eu já conhecia o artigo do Aroldo (e, inclusive, já o havia <br>
> incluído na Bibliografia Macro-Jê: <a href="http://macro-je.etnolinguistica.org/item:5">http://macro-<wbr>je.etnolinguisti<wbr>ca.org/item:<wbr>5</a> <br>
> 1). A análise dele é idêntica à sua? É que não tive ainda tempo <br>
> de ler seu artigo do IJAL; e o da Ameríndia, pelo visto, ainda não <br>
> está disponível online, está?<br>
><br>
> Então, o que me lembro da sua análise foi o que discutimos já há <br>
> alguns anos, e pode ser que você tenha mudado desde então. Minha <br>
> principal objeção, na época, era que você não admitia o caráter <br>
> nominal dos verbos longos. Se são mesmo nomes -- como sugeria o <br>
> Ludo, e como analisa também o Andrés --, então toda construção <br>
> envolvendo verbos longos é (originalmente, pelo menos) nominal. E, <br>
> se toda construção ergativa envolve um verbo longo, então a <br>
> ergatividade é uma conseqüência do caráter nominal do "verbo", <br>
> que, por sua vez, é uma conseqüência do fato de que os morfemas <br>
> que o seguem -- adposições, auxiliares -- requerem uma forma <br>
> nominal do verbo.<br>
><br>
> Há, por outro lado, aquelas construções em que o verbo não é <br>
> seguido de nenhum "operador" (um rótulo interessante que vocês usam <br>
> mas que, para mim, tem valor descritivo duvidoso). A suposição sua <br>
> é, se me lembro bem, que tais construções são finitas -- e, <br>
> portanto, não há como analisar-se o verbo nestas construções como <br>
> sendo nominal. Se for este o caso -- e pode ser que eu tenha te <br>
> entendido mal --, seria uma suposição equivocada quanto a <br>
> "finitude" (finiteness)<wbr>, como se toda construção finita tivesse que <br>
> ter um verbo -- o que não é o caso, necessariamente, nas línguas <br>
> Macro-Jê e mesmo em línguas européias.<br>
><br>
> ERGATIVIDADE EM PORTUGUÊS. Então, aplicando a análise de <br>
> Benveniste ao português, teríamos, como em latim, um padrão <br>
> absolutivo na expressão do argumento de nomes deverbais: em <br>
> "destruição da cidade", "cidade" corresponde ao O; em "entrada de <br>
> animais", "animais" corresponde ao S. Para exprimir o A, um <br>
> argumento externo é necessário: "destruição da cidade pelo <br>
> inimigo". Enfim, S=O≠A. Eba, ergatividade!<br>
><br>
> Imaginemos, então, que um lingüista que não conheça a história <br>
> desta construção encontre usos como:<br>
><br>
> Proibida e entrada de menores (S)<br>
> Permitido o consumo de leite (O)<br>
> Proibido o consumo de álcool (O) por menores (A)<br>
> etc.<br>
><br>
> Será que este lingüista hipotético analisaria "entrada" e <br>
> "consumo" nestes exemplos como formas verbais finitas? E o português <br>
> como língua ergativa?<br>
><br>
> Se puder, por favor, me envie os trabalhos que você mencionou, por <br>
> email. Não poderei lê-los tão cedo, mas, assim que tiver mais <br>
> tempo, gostaria de fazê-lo.<br>
><br>
> Abraços,<br>
><br>
> Eduardo<br>
><br>
> --- Em <a href="mailto:etnolinguistica%40yahoogrupos.com.br">etnolinguistica@<wbr>yahoogrupos.<wbr>com.br</a>, Flávia de Castro Alves <br>
> <pahno@...> escreveu<br>
> ><br>
> > Olá Eduardo.<br>
> > Aproveito para te perguntar uma dúvida que tenho sobre sua <br>
> opinião a respeito do alinhamento ergativo nas línguas<br>
> > Jê Setentrionais: pelo que foi dito na sua última mensagem sobre <br>
> a ╲chamada ergatividade nestas línguas╡ (palavras<br>
> > suas), você considera que, sincronicamente, não há alinhamento <br>
> ergativo? Se sim, quais seriam essas línguas.<br>
> > No caso do Canela, a partir do comportamento sintático exibido <br>
> pela língua, não há outra alternativa a não ser<br>
> > considerar as construções ergativas sincronicamente como <br>
> orações principais.<br>
> > Ainda sobre os estudos em sintaxe diacrônica do Jê Setentrional, <br>
> te passo mais essa referência de um trabalho que<br>
> > orientei, defendido na Unicamp em 2008 (qualificação de área):<br>
> > ANDRADE, Aroldo Leal de. Percursos de gramaticalização da <br>
> ergatividade em línguas Jê setentrionais. In: BRAGGIO, S.<br>
> > L. B.; SOUSA FILHO, S. M.. (Org.). Línguas e Culturas Macro-Jê. 1 <br>
> ed. Goiânia: Gráfica e Editora Vieira, 2009, v. 1, p.<br>
> > 43-68.<br>
> > Fico no aguardo.<br>
> > Com um abraço,<br>
> > Flávia<br>
> ><br>
> ><br>
> ><br>
> > On Sáb 13/03/10 03:08 , "Eduardo Rivail Ribeiro" kariri@... sent:<br>
> > > Cara Maísa,<br>
> > > A mensagem da Flávia me fez lembrar de uma outra possível<br>
> > > sugestão de leitura -- um pequeno texto que escrevi em 2003<br>
> > > sugerindo uma hipótese sobre a origem da "ergatividade" em <br>
> línguas<br>
> > > Jê Setentrionais:<br>
> > > <a href="http://www.wado.us/paper:ergatividade">http://www.wado.<wbr>us/paper:<wbr>ergatividade</a><br>
> > > Já me intrigava então o fato de que as análises que eu havia<br>
> > > visto sobre a chamada ergatividade nestas línguas pareciam <br>
> ignorar<br>
> > > um fato evidente: que tal alinhamento era, simplesmente, uma<br>
> > > conseqüência do caráter nominal das construções envolvidas --<br>
> > > já que as mesmas envolvem as chamadas "formas longas" dos verbos,<br>
> > > que são, afinal, nomes.<br>
> > > Assim, a situação em Jê Setentrional seria idêntica, em<br>
> > > princípio, ao que se vê no latim e no inglês (cuja<br>
> > > nominalizações também seguem um padrão absolutivo), como<br>
> > > descritos, respectivamente, em dois textos clássicos: o artigo <br>
> sobre<br>
> > > o genitivo latino, de Benveniste; e "Remarks on Nominalization"<wbr>, <br>
> de<br>
> > > Chomsky.<br>
> > > Talvez haja alguma utilidade em consultar este textinho -- pelo<br>
> > > menos pelas referências a estes dois textos fundamentais e a um<br>
> > > terceiro, importante para o assunto em questão: um artigo de<br>
> > > Ludoviko dos Santos propondo (pela primeira vez?) que os tais <br>
> verbos<br>
> > > longos seriam, de fato, formas nominais.<br>
> > > Como no caso do Karajá -- em que um "split" ativo-estativo foi<br>
> > > proposto com base no comportamento de descritivos, que são, na<br>
> > > verdade, nomes --, este assunto demonstra a importância de se<br>
> > > estabelecer bem critérios para distinguir nomes de verbos, <br>
> papéis<br>
> > > semânticos e gramaticais, etc., antes de se partir para a <br>
> análise<br>
> > > de sistemas de alinhamento. Do contrário, corre-se o risco de se<br>
> > > fazer "translation-<wbr>based linguistic analysis".<br>
> > > Abraços,<br>
> > > Eduardo<br>
> > > --- Em <a href="mailto:etnolinguistica%40yahoogrupos.com.br">etnolinguistica@<wbr>yahoogrupos.<wbr>com.br</a>, Flávia de Castro Alves<br>
> > > escreveu<br>
> > > ><br>
> > > > Olá Maísa.<br>
> > > > Eu tenho trabalhado com a nominalização (oracional) e sua<br>
> > > relação com os sistemas de alinhamento em Canela (Jê<br>
> > > > Setentrional)<wbr>, mais especificamente o alinhamento ergativo e um<br>
> > > outro, que tenho descrito como nominativo-<br>
> > > > absolutivo (neste, houve a perda da categoria ergativo). Indico<br>
> > > abaixo alguns trabalhos meus sobre esse tema.<br>
> > > > Havendo interesse, posso disponibilizá<wbr>-los eletronicamente.<br>
> > > ><br>
> > > > 1) Castro Alves, Flávia de. No Prelo. Evolution of case-marking<br>
> > > in Timbira. International Journal of American<br>
> > > > Linguistics, October, 2010. 82pp.<br>
> > > ><br>
> > > > 2) Gildea, Spike & Castro Alves, Flávia de. No Prelo.<br>
> > > Nominative-Absoluti<wbr>ve: Counter-Universal Split Ergativity in Jê<br>
> > > > and Cariban. Gildea, Spike & Francesc Queixalós (eds.).<br>
> > > Ergativity in Amazonia (Typological Studies in Language, 89).<br>
> > > > Amsterdam: John Benjamins Publishing Company. pp. 263-318. April<br>
> > > 15, 2010.<br>
> > > ><br>
> > > > 3) Castro Alves, Flávia de. 2010 Complement clauses in Canela,<br>
> > > atualmente submetido à publicação.<br>
> > > ><br>
> > > > 4) Castro Alves, Flávia de. 2008. O papel das nominalizações <br>
> na<br>
> > > evolução do alinhamento ergativo nas línguas Jê:<br>
> > > > dimensões funcionais e estruturais. AMERINDIA 32. pp.11-25.<br>
> > > ><br>
> > > > Além disso, uma dissertação de mestrado foi defendida semana<br>
> > > passada no meu programa de pós-graduação (PPGL<br>
> > > > / UnB). Logo logo deve estar disponível. De qualquer forma, <br>
> você<br>
> > > pode entrar em contato com o autor. Segue a<br>
> > > > referência:<br>
> > > > Título:<br>
> > > > As nominalizações na sintaxe da língua Krahô (Jê)<br>
> > > > Autor:<br>
> > > > Maxwell Gomes Miranda<br>
> > > ><br>
> > > > Com um abraço,<br>
> > > > Flávia<br>
> > > ><br>
><br>
> <br>
<br>
</p>
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