[etnolinguistica] Lan çamento do n° 28 da Revista Amerindia
Eliane Camargo
e.camargo at FREE.FR
Sun Jan 16 10:17:47 UTC 2005
Foi lançado em dezembro 2004 o número especial "línguas caribes", da Revista
Amerindia (28), com a participação de 13 autores, 11 dos quais caribistas.
Abaixo indicamos (1) os resumos dos textos apresentados sobre as línguas
caribes e, (2) como obter um exemplar, em forma impressa ou eletrônica.
Cordialmente
E. Camargo & O. Lescure (orgs)
1. RESUMOS
Spike GILDEA - Propondo um novo ramo para a família lingüística caribe
As classificações internas da família caribe têm sido problemáticas por
falta de dados fonéticos confiáveis e por falta aparente de mudanças
fonéticas suficientes que identifiquem as inovações compartilhadas. Mesmo
que Girard (1971) tenha proposto de forma fiável grupos de nível mais baixo,
suas tentativas ulteriores para combinar estes grupos em um super ordenado
macro-grupo e ramos não são convincentes. Este texto propõe três novos
agrupamentos: baseando-se, de um lado, em uma inovação fonológica e lexical
e em duas gramaticais, o grupo Pemón, (Pemón, Kapón, Macuxi) e Panare,
formando o macro-grupo panare-pemón. Do outro lado, o macro-grupo
Tamanaku-Panare-Pemón com base em uma inovação lexical e em quatro
gramaticais. Adiciona-se, com base em uma inovação fonológica e em uma
morfológica, o Mapoyo, Yabarana, †Chayma, †Cumanagoto e De’kwana ao
Macro-grupo TPP que forma o ramo venezuelano. Estas propostas apresentadas
devem ser interpretadas como hipóteses e nem tanto como conclusões, devido a
disponibilidade limitada de dados para tais análises. Estas não deixam,
mesmo assim, de ser um estímulo para futuros trabalhos de campo no conjunto
das línguas caribes.
Marie Cl. MATTEI MULLER - Pemon, cadeia perdida entre Mapoyo e Yawarana:
línguas caribes da Guiana Norte ocidental da Venezuela
Esta artigo examina os estreitos laços genéticos que, em diferentes níveis
(sobretudo o fonológico e o mofossintático), caracterizam duas línguas
caribes pouco estudadas da Venezuela: o Mapoyo e o Yawarana. Esta análise
comparativa está enriquecida pela apresentação de dados originais, devido à
descoberta do autor, de um estado de língua intermediária entre o Mapoyo, o
Yawarana, chamado Pemon que, até agora, é totalmente desconhecido. Um dos
pontos relevantes da análise refere-se à apresentação da ergatividade nestas
línguas, sendo este um dos elementos novos que conduzem o autor a repensar o
problema da classificação dentro da familia caribe. A luz destes dados,
propõe-se uma possível afiliação do conjunto Mapoyo-Pemono-Yawarana ao grupo
Pemon, situado mais ao sul do maciço guyanês.
José ALVÁREZ - Redução silábica e preservação de moras na língua kali’na
Nas descrições das línguas caribes, menciona-se de forma crucial a redução
silábica (RS), fenômeno que cria um grande alomorfismo pelo qual certas
sílabas finais de tema CV perdem-se na sufixação (Gildea 1995, Derbyshire
1999). A RS tem sido normalmente interpretada como se implicasse um processo
de dois passos em que a vogal é elidida e assim a consoante, se for uma
obstruinte, é desbucalizada. Este artigo mostra que ao menos em kari’na, a
RS e outros processos fonológicos, aparentemente não relacionados, podem ser
uniformemente descritos em termos de preservação de moras. Após de ver os
casos de incremento moráico, usados principalmente como opções para criar
pés iâmbicos (Hayes 1995), propomos interpretar a RS como elisão da vogal
alta tendo como resultado a perda de uma consoante que não é silabificável,
mais sim desbucalizada. A mora associada é deixada sem material melódico, é
porém preservada crucialmente pela sua associação com uma consoante mínima
(glotal). Em prol desta interpretação examinamos outros casos de onde tais
consoantes glotais de superfície funcionam para preservar ou aumentar a
estrutura moráica, sem que seja possível postular obstruintes sujacentes
para elas. A preservação de moras também dá conta de casos opacos de Reflexo
vocálico onde uma vogal alta, que desencadearia (triggering) na sílaba
anterior, está ausente. A mora, associada anteriormente à vogal alta
(sujacente) e desencadeante, é preservada mediante de uma geminação
consonântica. Conclui-se assim que as glotais de superfície presentes na RS
em kari’ña são inseridas, relevando somente uma das várias estratégias
usadas para preservar a estrutura moráica original.
Ana Carla BRUNO - Reduplicação em waimiri atroari
Este artigo analisa o fenômeno da reduplicação em Waimiri Atroari, adotando
o instrumental teórico da Abordagem da Correspondência (Teoria da
Optimalidade). De acordo com McCarthy & Prince (1997), a reduplicação é uma
questão de identidade: o reduplicante copia a base. No entanto, como estes
autores apontam, nem sempre se pode obter uma identidade perfeita entre o
reduplicante e a base. Em Waimiri Atroari, o reduplicante ocorre à esquerda
da base e deve ser bimoraico. Como há raízes não bimoraicas, o mapeamento
das correspondências entre a base e o reduplicante tende a ser parcial. O
artigo organiza-se da seguinte forma: na Introdução, apresentam-se
informações gerais sobre a língua e seus falantes; na Seção 2, descreve-se o
processo de reduplicação em Waimiri Atroari; na Seção 3 discute-se a
relevância teórica dos dados desta língua e apresenta-se a definição das
restrições selecionadas ; apresenta-se depois uma análise baseada no modelo
da otimalidade para ilustrar as generalizações e restrições estabelecidas;
por fim, na Seção 4, apresenta-se a conclusão.
Eliane CAMARGO - Relações sintáticas e semânticas na predicação nominal em
wayana: a construção com a cópula
Em Wayana, a predicação nominal é manifestada por duas construções : uma
delas é sem verbo, a outra é marcada pela presença da cópula (-a-/-eha-), a
qual índices pessoais agregam-se. Este texto analisa essa segunda
construção, em seus diferentes empregos : a relação de inclusão, de
atribuição, de localização ou a relação de pertencimento. Esses campos
semânticos são indicados por lexemas ou por sufixos, especificadores de cada
um desses campos que se agregam ao elemento nominal não predicativo. Essas
relações predicativas expressam um valor aspectual sujacente recuperado na
construção negativa, marcada por dois operadores de negação, tapek (estado
permanente) e –la (estado contingente). Ademais, a negação de uma relação de
pertencimento pode ser marcada pelo privativo mna ‘sem’ que, contrariamente
aos outros dois operadores de negação, não expressa nenhum valor aspectual.
No falar moderno do Wayana, a cópula apresenta uma irregularidade que
codifica aspecto-tempo, a saber : no presente é a forma lexical –a, e no
passado é representada por forma –eha. O passado é expresso por dois valores
aspecto-temporais, com os quais o enunciador exprime a sua atitude em
relação ao estado no passado: com um deles, não materializado fonicamente, o
enunciador exprime uma ligação com o estado no passado, e com o outro,
marcado por –ken (e kun-…-k), expressa, ao contrário, não estar vinculado
com este estado.
Eithne B. CARLIN - O papel do experienciador na expressão de estados mentais
e atividades em tiriyó.
Os conceitos descritos neste artigo são todos de estado e de atividades
“mentais” que regrupo em expressões de percepção, cognição, emoção e
comportamento mental. Estes conceitos expressam-se como ações e estados em
Tiriyó. O presente artigo olha a codificação dos participantes envolvidos em
tais conceitos que são o sujeito, o objeto, o participante oblíquo, e o
papel que eles desempenham como a do experienciador, a do perceptor e a do
estímulo, observando assim como eles são expressos. Trata-se, na verdade, do
papel do experienciador em exemplos como tëtamorehtë (eu.mesmo.espírito-
provei) « sonho » e (medo.INSTR eu.sou) « estou com medo ».
Frantomé PACHECO - Verbos intransitivos em ikpeng (caribe) : proposta de
organização morfosintática.
O trabalho propõe uma organização dos verbos intransitivos da língua ikpeng
(Caribe), empregando critérios morfossintáticos como o tipo de flexão
pessoal e os morfemas derivacionais encontrados no verbo. Partindo-se desses
critérios, chegamos a cinco tipos de verbos: 1) ativo; 2) ativo-reflexivo;
3) médio-reflexivo; 4) inativo animado; 5) inativo inanimado.
Sergio MEIRA - Proximais inanimados demonstrativos da língua tiriyo: um
estudo de corpus.
O objetivo deste trabalho é examinar a diferença semântica entre dois
pronomes demonstrativos proximais, se(nï) e serë, considerados “sinônimos”
pelos falantes consultados. Por meio do estudo de um corpus de textos tiriyó
(aproximadamente 34.000 palavras), certas diferenças de uso se tornam
perceptíveis, o que conduz à proposta de uma hipótese sobre a distinção
semântica entre os dois demonstrativos. Essa hipótese permite a crítica de
um texto bíblico traduzido, onde se percebe que o tradutor missionário não
compreendeu a diferença semântica entre se(nï) e serë.
Odile RENAULT-LESCURE - Nomes de partes do corpo e incorporação em Kali’na
(Galibi) da Guiana Francesa
A incorporação nominal é geralmente apresentada como um tipo de composição
do verbo, com propriedades morfológicas, sintáticas e semânticas específicas
e debatidas. O Kali’na acrescenta à composição do verbo outros tipos de
composições, como a do advérbio e a da posposição, e, em todos os casos,
limita esta incorporação aos nomes das partes do corpo. O artigo descreve as
diferentes formas de incorporação procurando as propriedades e as funções
comuns que caracterizam o fenômeno.
Tania C. de SOUZA - Referencialidade em Bakairi
Este trabalho tem como objetivo o estudo das marcas de referencialidade em
Bakairi, falada por aproximadamente 950 indivíduos, alocados no Brasil
Central. O sistema de elementos referenciais na língua apresenta um
funcionamento e uma sistematização que não são fáceis de acessar exatamente
porque a sua significação depende das condições de produção discursiva. Para
se entender o funcionamento e a sistematização dos dêiticos e elementos
referenciais em Bakairi, é preciso se depreender não só a situação em si,
mas de que ponto de vista se define a denotação: locutor/fato ou
enunciador(personagem)/fato. Essas duas perspectivas, porém, não são
alternativas, considerando-se que o ato de narrar constitui a própria
narrativa. E é nesse escopo que se institui a referencialidade.
Conseqüentemente, para entender o alcance dos elementos referenciais, bem
como o seu sentido, não basta listá-los segundo uma categorização
determinada a partir do seu significado. A referencialidade se define nas
condições de elocução, e é sob essas condições que os elementos referenciais
em Bakairi serão explicitados.
Bruna FRANCHETTO - Paralelismo e gramática na arte verbal das narrativas
kuikuro (Alto Xingu)
As narrativas tradicionais dos Kuikuro, etnia da língua caribe do Alto Xingu
(Brasil), são peças orais da arte de narrar ; a competência narrativa de
seus « mestres » é uma arte do paralelismo nas suas formas mais complexas e
variadas. A hipótese de trabalho basea-se na idéia de que a descrição e a
análise das estruturas gramaticias, presentes nos « textos » na língua
vernacular, permite apreender a lógica e a estética das repetições
paralelísticas da narrativa. Na primeira parte, o objeto do ‘relato” é
definido como tipo de discurso com as marcas de sua unidade e de seus
constituintes. A segunda parte é dedicada ao macro-paralelismo, cuja
estrutura revela os temas fundamentais do relato e permite estabelecer uma
ponte entre mito e rito. Os micro-paralelismos são analisados na terceira
parte. As formas lexicais, morfológicas e sintáticas engendradas pela
gramática são postas à serviço de uma arquitetura das formas do paralelismo.
Análise que, na conclusão, leva a uma interpretação do princípio dualista
inerente no sentido metalingüístico do termo otohongo que os Kuikuro
utilizam para definir a duplicidade que produz derivação, sinonímia e
repetição paralelística.
O corpus examinado é constituído de uma dezena de akinhá ekugu, relatos
tradicionais ou míticos, gravados e transcritos, acompanhados de uma
tradução justalinear e de uma tradução literária. A maior parte dos
exemplos provém do relato dos Jamugikumalu ou das Super-Mulheres.
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