Sobre o etnônimo 'Karajá'

Eduardo Ribeiro kariri at GMAIL.COM
Thu Sep 8 16:33:31 UTC 2005


Prezados,
 Venho, mais uma vez, solicitar o auxílio dos colegas da lista 
(particularmente daqueles que trabalham com línguas da família Tupí-Guaraní) 
para esclarecer uma questão -- a da origem do etnônimo "Karajá". Em geral, 
lingüistas e etnógrafos que trabalham com os povos de língua Karajá 
(Xambioá, Javaé, Karajá do Sul e Karajá do Norte) concordam quanto à origem 
deste etnônimo: o termo "karajá" seria de origem [Tupi-]Guarani, 
referindo-se ao macaco guariba (ou bugio). (Os Karajá se auto-denominam *iny
* [i'nã].)
 Este termo tem uma distribuição razoavelmente ampla no Brasil Central; além 
de ser usado por outros povos indígenas, bem como pelos não-índios, para se 
referir aos Karajá, o termo é também usado para se referir aos Kayapó; 
assim, os Tapirapé chamam aos Karajá de [kãrã'txã] e aos Kayapó de 
[kãrãtxã'o] (literalmente, 'Karajá grande'); curiosamente, os Karajá também 
se referem aos Kayapó por um termo cognato deste, [krala'hu ~ karala'hu]. 
Este último termo -- sob a forma Gradaú ou Gradahú -- ocorre freqüentemente 
na literatura histórica do Centro-Oeste (trabalhos clássicos como os de 
Cunha Mattos e Silva e Sousa, por exemplo) como denominação de vários grupos 
étnicos pouco conhecidos (Ribeiro 2001). 
 Acontece que o termo "Karajá" não parece ser encontrado, na acepção de 
'guariba', em nenhuma das línguas de povos Tupí-Guarani com os quais tanto 
os Karajá, quanto os Kayapó, teriam estado em contato. Em Tapirapé, por 
exemplo, é usado exclusivamente como etnônimo (Walkíria Praça, c.p.). De 
fato, em um artigo esclarecedor, Aryon Rodrigues (vide referências abaixo) 
sugere que este termo para 'guariba' seria restrito às línguas Tupí-Guaraní 
dos subgrupos I (Guarani, etc.) e II (Sirionó, etc.). Não ocorreria, assim, 
no subgrupo III, ao qual pertenciam o Tupinambá e o Tupi Austral, que deram 
origem às línguas gerais Amazônica e Paulista, respectivamente.
 Uma possibilidade que me ocorreu, inspirada pelo artigo de Rodrigues, é que 
o etnônimo "Karajá" teria sido, afinal, difundido através de falantes da 
Língua Geral Paulista -- os bandeirantes, que deixaram uma trilha de termos 
Tupí-Guaraní tanto na toponímia do Centro-Oeste, quanto no léxico de línguas 
indígenas da região, como o próprio Karajá (Ribeiro 2001) e o Boróro (Viana 
2003). Tal hipótese fundamenta-se em um fato notável apontado por Rodrigues 
(p. 6): "Embora a língua dos Tupinambá e a dos Tupí sejam muito próximas, a 
dos últimos compartilha com II certas características que não se encontram 
em Tupinambá."
 Estou, assim, investigando a hipótese de que o termo "Karajá" teria de fato 
ocorrido em Tupí Austral (e, conseqüentemente, na Língua Geral Paulista), 
talvez por influência de línguas dos subgrupos I e II. Alguém poderia me 
sugerir evidências que ajudem a confirmar ou refutar esta hipótese?
 Desde já, muitíssimo obrigado por qualquer ajuda.
 Abraços,
 Eduardo
 *Referências:*
** 
Ribeiro, Eduardo Rivail. 2001. Empréstimos Tupí-Guaraní em Karajá. In *Revista 
do Museu Antropológico*, v. 5/6, pp. 75-100. Goiânia: Editora da UFG.
 Rodrigues, Aryon. (sem data). Hipótese sobre as migrações dos três 
subconjuntos meridionais da família Tupí-Guaraní. Disponível em 
http://geocities.yahoo.com.br/lviz56/hipotese.pdf 
 Viana, Adriana Soares. 2003. Sobre a língua Boróro. In *Anais do II 
Encontro Nacional do GELCO*, vol. 1, pp. 42-48. Disponível em 
http://gelco.crucial.com.br/volume1.pdf
 -- 
Eduardo Rivail Ribeiro
Museu Antropológico, Universidade Federal de Goiás 
Grupo de Pesquisa "Estudos Histórico-Comparativos Macro-Jê"
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