Sobre Kaingang na Argentina / Ainda Kaingang (Argentina e Brasil)

eduardo_rivail kariri at GMAIL.COM
Tue Feb 13 01:04:28 UTC 2007


Caro Pedro,   Eu é que agradeço as suas mensagens (bem como as do
Renato, do Victor e do Wilmar). A gente acaba aprendendo muito com essas
discussões. Muitíssimo obrigado também pelos esclarecimentos
sobre a localização dos Guayaná e Ingain e pela discussão
detalhada das correspondências KAI :: GUY.   Quanto às
correspondências que você aponta, elas são sem dúvida
válidas (como você diz, em maior ou menor grau). Há aí,
certamente, dados claramente de origem Kaingáng/Jê do Sul --
portanto, uma certa regularidade entre ambos os conjuntos de dados seria
de se esperar. Mas, em sua maioria, não apontam necessariamente para
uma língua diferente. A principal diferença (KAI eN, GUY/ING a)
aproximaria o Guayaná/Ingain à hipotética forma Proto-Jê do
Sul, onde PJ *ò teria se tornado *a. Em Xokleng, esta é a vogal
que ocorre ainda (apenas um dos vários aspectos em que o Xokléng
é mais conservador que o Kaingáng). Aliás, isto já havia
sido apontado por Curt Nimuendaju em sua correspondência com Mansur
Guérios: "Num numero de casos as formas da lingua dos Botocudos
[Xokléng] se assemelham mais às dos Tupí do Ivoticoray (Ingain)
que às dos Kaingáng [...]" ("Cartas Etnolingüísticas", p. 220;
disponível na Biblioteca Curt Nimuendaju:
http://biblio.etnolinguistica.org/nimuendaju_guerios_1948.pdf
<http://biblio.etnolinguistica.org/nimuendaju_guerios_1948.pdf> ).  
Quanto aos dados aparentemente não-Jê do Sul que você menciona
('pescoço' e 'pedra'), eu concordo que a forma para 'pedra' seria um
cognato plausível, mas tenho minhas dúvidas com relação à
palavra para 'pescoço'. De qualquer forma, é bem comum que um
dialeto preserve formas lexicais que outros dialetos perderam. Isto
não significa necessariamente que se trate de uma língua
diferente. Tudo isto, na minha opinião, não permitiria descartar o
"Ingain/Guayaná" (ou pelo menos a parte "Kaingangóide" dos dados)
como um descendente do Proto-Jê do Sul (ou mesmo a possibilidade de
que se trate apenas de uma variedade de uma outra língua do ramo,
como o próprio Kaingáng). Uma das principais mudanças
fonológicas que caracteriza o Proto-Jê do Sul (em oposição ao
Proto-Jê) é o rebaixamento de *ò para *a, e isto pode ser
observado nos dados Ingain/Guayaná. Aliás, como sugere o Wilmar em
seu artigo (http://www.portalkaingang.org/Primeiros100anos.pdf
<http://www.portalkaingang.org/Primeiros100anos.pdf> ), estes dados
têm um valor comparativo e tanto. Eu acho que eles ampliam a nossa
visão do Proto-Jê do Sul, em vez de sugerir uma língua fora
deste ramo. Falando nisso, eu discordaria do que diz Wilmar (p. 13)
quanto à aparente "perda" de uma sílaba inicial nos dados "Ingain"
de Ambrosetti, em palavras como 'macaco', 'vermelho', etc.
Considerando-se que há, em Kaingang, prefixos claramente
segmentáveis (ka-,ku- etc.), ainda que de significado opaco e
sincronicamente improdutivos (aparentemente), é provável que a
"falta" da sílaba inicial não se deva a "perda" fonológica, mas
a fatores morfológicos. Isto parece sugerir que tais prefixos eram
ainda produtivos em Proto-Jê do Sul. (Cognatos destes prefixos
ocorrem em outras línguas da família e podem, assim, ser
reconstruídos para o Proto-Jê.)   Quanto a minha menção do
exemplo Kukura, minha intenção não era jamais insinuar que Lista e
Patiño teriam inventado uma língua (como, aliás, no caso do
Kukura, em que não parece ter havido má fé por parte dos
pesquisadores envolvidos). O que eu queria exemplificar era o fato de
que o valor de um vocabulário como amostra de uma língua é
muito relativo, sendo influenciado muito pelas circunstâncias da
coleta (e por idiossincrasias pessoais do pesquisador e do informante).
Um vocabulário misto não aponta necessariamente para a
existência de uma língua mista, a menos que seja possível
demonstrar recorrência, consistência de uma amostra a outra (isso,
se houver mais de uma amostra). E aqui eu volto a uma das minhas
questões originais: seria ótimo saber até que ponto diferentes
vocabulários do Guayaná e os do Ingain (pelo que vi no artigo do
Wilmar, há mais de um) difeririam. Fico ansioso para poder finalmente
ler o trabalho de Ambrosetti!   Bem, este assunto vai se encompridando,
e eu agradeço mais uma vez a sua disposição em discutir tão
detalhadamente os dados. Pode ser que, no final, eu acabe mudando de
idéia (e não seria a primeira vez que os seus argumentos me
convenceriam:). Mas, por enquanto, acho que os dados não permitem
chegarmos a qualquer conclusão; há várias hipóteses que
não parecem ser de todo desprezíveis. Mas, antes de me despedir,
gostaria de resumir os resultados do que eu aprendi com vocês até
o momento:   1. Revendo meu pessimismo inicial, concordo com você: os
dados não são "cem porcento Kaingáng", embora uma parcela
significativa tenha obviamente a mesma origem. 2. Esta "parcela
significativa" tem um importante valor comparativo, pelas diferenças
que apresenta com relação às línguas Jê do Sul atuais; mas
tais diferenças não permitem propor uma língua fora do ramo
meridional da família Jê.   Um abraço,   Eduardo
--- Em etnolinguistica at yahoogrupos.com.br, Pedro Viegas Barros
<peviegas2003 at ...> escreveu
>
> Estimado Eduardo (y demás colegas),
>
> Muchísimas gracias por su respuesta. Siempre se aprende mucho de
sus contribuciones. Coincido plenamente con Ud. acerca de la necesidad
de reevaluar críticamente la bibliografía sobre lenguas
indígenas y sobre la importancia del artículo de Wilmar, lo que
también es cierto de los mensajes de Renato y Victor.
> Agradezco mucho también su discusión sobre las lenguas mixtas y
la información que proporciona sobre el caso del Pankararu. Son ambas
muy importantes.
> Sobre la cuestión de las correspondencias fonológicas, creo que
puede hacerse alguna pequeña luz –a pesar de los escasos datos y
de las dudas sobre su transcripción y sobre cómo fueron obtenidos
los datos- si se eliminan algunos posibles cognados dudosos y se agregan
algunos otros. Si se aceptan tales comparaciones (algunas son
ciertamente más aceptables que otras), sería posible encontrar
algunas correspondencias Guayaná-Kaingáng como las siguientes
(para las vocales me voy a limitar por el momento a las sílabas
finales; las expresiones `inicial', `medial',
`intervocálico', `final' se refieren a los presuntos
cognados Kaingáng).
>
> Consonantes
>
> (1) G <m>, <nm> : K m (inicial)
> G má `miel de abeja'; K myNg `abelha, mel'
> G nmará `ceniza'; K mreNj `cinza'
> La correspondencia de G <nm> con K m inicial sería paralela a la de
G <np> con K p en el mismo contexto.
>
> (2) G <n> : K n (inicial)
> G (ami)nerá `oreja'; K niNgreNg `orelha'
> G (ami)nca(minuitá), (ame)nencá `manos'; K niNgè
`mão'
> En posición inicial habría G <n>, <nl> : K n en
> G cran, pranl `agua', K kron `beber, dar à beber'
> Cf., además, G queré [¿-r- por errata?], quené
`piedra', Jê Septentrional *kèn `pedra'.
>
> (3) G <ñ> : K ñ (inicial)
> G (ami)ñá; K ñiNjèN `nariz'
> También habría G <ñ> correspondiente a una alternancia K n ~
j en:
> G (an)ñá `madre'; K nyN, jyN `mãe'
> En posición final habría G <i> (¿<y>?) : K ñ en:
> G (ñami)ngai `cabellos' [¿y -ngay en (api)tamingay
`pestañas', posiblemente *`pelos de los ojos'?], K
gaNñ `cabelo'.
>
> (4) G <ng> : K g (inicial)
> G (ñami)ngai `cabellos', K gaNñ `cabelo'.
> En posición intervocálica hay G <nc> : K g en:
> G (ami)nca(minuitá), (ame)nencá `manos'; K niNgè
`mão'
> Y en posición final hay G Ø : K g, como se ve en:
> G má `miel de abeja'; K myNg `abelha, mel'
> G (ami)nerá `oreja'; K niNgreNg `orelha'
> G prá `estrella', K kriNg `estrela'
> El grupo intervocálico K gr corresponde a G <r> en:
> G (ami)nerá `oreja'; K niNgreNg `orelha'
>
> (5) G <p>, <np>, <m> : K p (inicial)
> G pohó `zapallo', K pèho `abóbora'
> G npai 'fuego', K piN `fogo, lenha'
> G npáo `zapo' (error por `sapo'), K pèpo
`sapo'
> G (am)má `brazo'; K peN `braço'
> En el primer ejemplo las formas son muy parecidas, de modo que
podría tratarse de un préstamo (lo que –por otra parte- es
bien plausible por tratarse de ítem cultural).
> En el último ejemplo, G <m> podría deberse a asimilación a la
consonante del ¿prefijo? <am->.
> El tercer ejemplo mostraría una correspondencia G -Ø- : K -p-
entre vocales.
>
> (6) G <c>, <qu>, <p> : K k
> G (a)cucá, (a)pucá `frente'; K kakaN `rosto,
testa'
> G curu(guá) `olla', K kukruN `panela'
> G quiñere `mono'; K kajeNr `macaco, mico'
> Los dos últimos ejemplos podrían ser préstamos (el primero es
un ítem cultural y el segundo un zoónimo: en ambos casos los
préstamos –incluso entre lenguas emparentadas- son frecuentes).
> Agréguese G queré, quené `piedra', Jê
Septentrional *kèn `pedra'; quizás también G (an)cai
`cabeza', PJ *ki `hair'.
> En posición intervocálica hay G <c> : K k, como en
> G (am)incá; K jeNky `boca'
> El grupo K kr en posición inicial correspondería a G <cr>, <pr>,
y en posición medial a G <r>:
> G (a)cré `muslo'; K kre `coxa'
> G cran, pranl `agua', K kron `beber, dar à beber'
> G prá `estrella', K kriNg `estrela'
> G curu(guá) `olla', K kukruN `panela'
> Aunque este último ejemplo podría ser un préstamo, véase
(6), la correspondencia de K kr con G <r> en posición
intervocálica sería paralela a la de K gr : G <r> en el mismo
contexto.
>
> (7) G <r> : K r en todas las posiciones
> G ará `cielo'; K: raN `sol'
> G (aminc)rará `quijada' : K ra `queixo'
> G (a)cré `muslo'; K kre `coxa'
> G cran, pranl `agua', K kron `beber, dar à beber'
> G prá `estrella', K kriNg `estrela'
> G (ami)nerá `oreja'; K niNgreNg `orelha'
> G curu(guá) `olla', K kukruN `panela'
> G quiñere `mono'; K kajeNr `macaco, mico'
> Los dos últimos ejemplos podrían ser préstamos, véase (6).
>
> (8) G <y>, <ñ> : K j
> G (ami)yao `dientes', K jaN `dente'
> G quiñere `mono'; K kajeNr `macaco, mico'
> El segundo ejemplo podría ser un préstamo, véase (6).
> Cf. también
> G (ami)ñá; K ñiNjèN `nariz',
> caso en el cual G <-ñá> podría estar ocultando algo como
*-ñijá.
>
> (9) G <h> : K h (intervocálica)
> G pohó `zapallo', K pèho `abóbora'
> Este único caso podría ser un préstamo, véase (5).
>
>
> Vocales en sílaba final
>
> (10) G <a> : K y, yN (correspondencia notada por Ud. en un mensaje
anterior)
> G (am)incá; K jeNky `boca'
> G (an)ñá `madre'; K nyN, jyN `mãe'
> G má `miel de abeja'; K myNg `abelha, mel'
>
> (11) G <a> : K eN, eNj, è, èN
> G (am)má `brazo'; K peN `braço'
> G (ami)nerá `oreja'; K niNgreNg `orelha'
> G nmará `ceniza'; K mreNj `cinza'
> G (ami)nca(minuitá), (ame)nencá `manos'; K niNgè
`mão'
> G (ami)ñá; K ñiNjèN `nariz'
>
> (12) G <e> : K e, eN
> G (a)cré `muslo'; K kre `coxa'
> G quiñere `mono'; K kajeNr `macaco, mico'
> El segundo ejemplo podría ser un préstamo, véase (6), lo que
explicaría la correspondencia G <e> : K eN, frente a G <a> : K eN en
(11).
>
> (13) G <a>, <ao> : K aN
> G ará `cielo'; K raN `sol'
> G (a)cucá, (a)pucá `frente'; K kakaN `rosto,
testa'
> G (ami)yao `dientes', K jaN `dente'
> G (ñami)ngai `cabellos', K gaNñ `cabelo'.
>
> (14) G <a>, <ai> : K iN
> G prá `estrella', K kriNg `estrela'
> G npai 'fuego', K piN `fogo, lenha'
> Posiblemente también G <ai> : PJ *i, si es válido G (an)cai
`cabeza', PJ *ki `hair'.
>
> (15) G <a>, <o>, (¿<ao>?) : K o
> G cran, pranl `agua', K kron `beber, dar à beber'
> G pohó `zapallo', K pèho `abóbora'
> El segundo caso podría tratarse de un préstamo, véase (5).
> En el caso de
> G npáo, K pèpo `sapo'
> no está claro si lo que correspondería a K o es G <ao> o solo
<o>, dado que en Guayaná habría caído una consonante
intervocálica, véase (5).
>
> (16) G <u> : K uN
> G curu(guá) `olla', K kukruN `panela'
> Este ejemplo, sin embargo, podría tratarse de un préstamo,
véase (6).
>
> (17) G <a> : K <a>
> G (aminc)rará `quijada' : K ra `queixo'
> Como bien señala Ud., también hay <a> donde se esperaría K a,
en el caso de:
> G (apin)tá `ojos', PJ *nò `olho'.
>
> Si estas correspondencias son válidas, entonces varios reflejos
Guayaná de los fonemas reconstruidos para el Proto-Jê serían o
parecerían ser distintos a los del Kaingáng. Lo que probaría
que el Guayaná era una lengua diferente del Kaungáng.
>
> Dado que en Guayaná habría ítems léxicos provenientes del
PJ no atestiguados en Jê del Sur, se podría tal vez hipotetizar
que el Guayaná podría haber sido la única lengua representante
de una rama de la familia Jê, algo similar a lo que ocurriría con
el Jaikó. En tal caso las mayores semejanzas léxicas con el
Kaingáng podrían deberse –dada la proximidad geográfica--
simplemente a fenómenos de difusión. Es sólo una idea que, me
parece, debería ser investigada.
>
> Paso a contestar en la medida de lo posuible las preguntas de su
segundo mail.
> Sería ciertamente muy interesante llegar a conocer los detalles de
las compilaciones de Patiño y Lista. Estos dos –creo- serían
los únicos registros Guayaná conocidos; no sé bien cuántos
habría para el Ingáin pero me parece que en este último caso la
única fuente es Ambrosetti.
> Los lugares en que se recolectaron datos Guayaná e Ingáin
parecen ser bastante próximos, separados por la actual frontera
política entre Paraguay (Guayaná) y Brasil (Ingáin).
> No sé cuántas semejanzas Guayaná-Ingáin se pueden
encontrar, cité algunas de unas anotaciones comparativas antiguas que
yo tenía; el artículo de Ambrosetti es realmente difícil de
encontrar en las bibliotecas de Buenos Aires y ya no recuerdo
exactamente dónde lo ví hace muchos años. Intentaré, sin
embargo, encontrarlo en algún lado.
> Por el momento, no tengo idea acerca del posible origen de la mayor
parte de los términos que no parecen cognados del Kaingáng ni de
otras lenguas Jê. En principio, no parecen ser de origen Mataguayo ni
Guaicurú (la excepción sería la forma para `cuchillo'
dada por Lista, ya mencionada en un mensaje anterior).
>
> Finalmente, si las correspondencias Guayaná-Kaingáng que
menciono pueden considerarse válidas, ello alejaría –en mi
opinión- la posibilidad de que se trate de una lengua ficticia como
el Kukura (no creo que Lista y Patiño conocieran el Kaingáng, ni
que tuvieran la menor idea de qué cosa es una correspondencia
fonética o fonológica).
>
> Un abrazo cordial,
>
> Pedro
>
> eduardo_rivail kariri at ... escreveu:
> Caro Pedro (e demais colegas),
> Muito obrigado por suas observações e desculpe-me por levar tanto
tempo para responder. Suas mensagens me levaram a repensar meu
pessimismo inicial. Embora eu tenha preferido me limitar às
semelhanças mais óbvias, concordo que muitos dos exemplos
adicionais que você menciona podem vir a ser de fato [cognatos com
termos] Kaingáng (exceto, creio eu, formas como 'estrela', 'fogo',
'sol', etc.).
> E diria mais: no caso da forma para 'olho', (apin)tá, a vogal é
o que seria de se esperar, considerando que em (Pré-)Proto-Jê do
Sul a vogal *ò do Proto-Jê se tornou *a, em um processo
sistemático de rebaixamento vocálico envolvendo vogais posteriores
(cf. Ribeiro 2005, 'Reconstructing Proto-Jê: A review of Davis
(1966)', apresentado em Belém, e Ribeiro 2006, 'A reconstruction of
Proto-Jê', apresentado no ICA em Sevilha); compare este exemplo com
'cinza', que ilustraria o mesmo fenômeno. E, no caso de 'braço', o
Jê Meridional de fato preservou um cognato com o Proto-Jê *pa: em
Kaingáng, por exemplo, é peN. O termo Proto-Jê para 'madeira,
árvore' (que eu reconstruo como *ko) também tem cognatos em Jê
Meridional: Xokléng kò, Kaingáng ka (por isso tendo a discordar
da possibilidade de Guayaná kuche ser um cognato, por causa do
processo de mutação vocálica, aparentemente em cadeia, que
menciono acima).
> O problema é que restam muitas inconsistências em termos de
correspondências fonológicas. Por exemplo, o Proto-Jê do Sul
(como, aliás, as línguas Jê do Sul atuais) preserva basicamente
o mesmo sistema de oclusivas do Proto-Jê. As consoantes em 'olho',
'braço' e 'barriga' destoariam desta tendência. Como os dados
são poucos, não dá pra saber se tais inconsistências se
devem a verdadeiras inovações ou simplesmente a uma transcrição
inconsistente (o que soía acontecer em tais circunstâncias) -- ou,
enfim, se se devem ao fato de os dados terem sido fornecidos por um
falante não nativo.
> Para mim, essa discussão tem, entre outros, o mérito de
demonstrar a necessidade de reavaliarmos a literatura criticamente (o
artigo do Wilmar, neste sentido, é um guia excelente). Por isso, fico
muitíssimo grato por você nos ter enviado o vocabulário
"Guayaná" e pelas contribuições do Renato e do Victor -- um
exemplo e tanto de cooperação acadêmica. Espero poder ter acesso
ao material Ingain em breve, para ter uma idéia melhor da
situação.
> Daqui a pouco respondo a sua outra mensagem.
> Abraços,
> Eduardo
>
>
> Caro Pedro (e demas colegas),
> Matutando sobre os dados que vocês vêm compartilhando com a
lista, ocorre-me agora que, afinal, talvez não se possa descartar uma
possibilidade de certa forma oposta à que expresso em minha primeira
mensagem ("não parece tratar-se de Kaingáng", etc.): talvez não
haja razões suficientes pra se falar em uma língua Jê
Meridional a mais. Os dados que coincidem indubitavelmente com os do
Kaingáng não parecem permitir uma conclusão a favor da
existência de uma língua diferente -- como, aliás, qualquer
conclusão definitiva.
> Eu acho interessantes as duas hipóteses aventadas por você, mas
tendo a ser cético com relação a "línguas mistas",
especialmente com base em dados insuficientes. Seria interessante
investigarmos mais sobre as circunstâncias da coleta. Eu tenho
algumas dúvidas que, se possível, ficaria muito grato se alguém
pudesse esclarecer:
> 1. Quantos registros separados (diferentes coletores e diferentes
informantes) há para o Ingain e o Guayaná?
> 2. Além dos termos em comum entre o Ingain e o Guayaná que
você menciona ('água', 'lua'), o que mais compartilham?
> 3. Alguém teria alguma pista quanto à possível origem dos
termos não-Kaingang nestes vocabulários?
> 4. Qual a proximidade entre as áreas onde se coletaram dados do
Ingain e do Guayaná?
> Mesmo que os vocabulários contenham itens de origens diferentes, eu
acho que um conhecimento mais detalhado das circunstâncias de campo
talvez ajude a se pensar em outras hipóteses. Meu ceticismo quanto ao
valor de vocabulários como esses para tentativas de classificação
lingüística baseia-se em alguns exemplos da literatura:
> 1. O caso do Kukura, uma "língua" que, apesar de fictícia (como
denunciado por Nimuendaju), foi classificada geneticamente por Greenberg
(o que dá uma idéia dos méritos classificatórios dele...);
não estou dizendo que se trata da mesma situação aqui, mas a
resposta a minha pergunta (1) acima ajudaria a termos uma idéia mais
precisa.
> 2. Vocabulários coletados, principalmente na segunda metade do
século passado, no Nordeste brasileiro, em que ficam evidentes
diferentes "camadas" de influência lexical. Os vocabulários
coletados entre os Pankararu, por exemplo, são particularmente
interessantes: o léxico básico (incluindo pronomes, partes do
corpo, termos de parentesco, descritivos, etc.) é claramente de
origem Tupi-Guarani (talvez o mesmo Tupinambá da costa); por outro
lado, há vários termos (itens culturais, fauna, etc.). que são
obviamente de origem Iatê. Neste caso, não creio que se possa
falar em língua mista, como se tivesse havido uma fase em que os
Pankararu teriam falado uma língua resultante da mistura de duas
outras. É mais provável que a parte Iatê do vocabulário seja
resultado de contatos recentes, quando o português já havia se
tornado a língua nativa da tribo.
> [A julgar pelos dados, parece provável que os ancestrais dos
Pankararu teriam falado o Tupinambá (ou uma língua muito
aparentada) a uma certa altura, mas se esta era a língua original da
tribo, ou se a adotaram por influência missionária, é algo a se
discutir. Se possível, eu gostaria muito de ouvir a opinião de
colegas aqui na lista que certamente conhecem melhor a situação
etnográfica do Nordeste, como a Maria das Dores Pankararu, o Renato
Athias, etc.]
> Bem, aguardo a opinião de vocês!
> Abraços,
> Eduardo
>
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