Mission ário s, lingüística indígena e a bíblia

Valdir Vegini vvegini at GMAIL.COM
Tue Oct 9 12:00:46 UTC 2007


Forçar um ser humano a traduzir (ou foi atraído pelo encanto do livro
sagrado como quer fazer crer Bento XVI) um livro cujo conteúdo não lhe diz
nada, ao contrário fala de um Deus macho, rabugento, vingativo, belicoso,
condenador, assassino é lavagem cerebral, sim. Dizer que o resultado da
tradução passa a ser um valioso material para estudos
científicos....sinceramente é maldade pura. Valdir Vegini - UNIR, Rondônia.

Em 08/10/07, Wilmar R. D'Angelis <dangelis at unicamp.br> escreveu:
>
>   Desculpe-me o João Carneiro, mas não se confundam as coisas.
> A Babilônia "religiosa" (melhor dizendo, a barafunda de denominações
> degladiando-se nas áreas indígenas > algumas suportam 10 ou mais seitas)
> não é e não pode ser vista como sinal de qualquer "avanço" ou mudança
> positiva para os povos indígenas.
> Por que não ver como retrocesso, então, o fato de que nossas sociedades (e
> seus religiosos dedicados, de qualquer denominação)não é capaz de aceitar
> a verdade da fé dos povos indígenas? A razão óbvia é: o princípio
> missionário é um princípio colonialista!
> E só faltava essa: o velho papo que o Summer usou por tanto tempo, de que
> a tradução do Novo Testamento ou qualquer livro bíblico era um "acervo"
> valioso de língua indígena. Me desculpe, mas isso sempre foi descarada
> desculpa para não fazer outra coisa, mais útil, em prol das línguas
> indígenas.
>
> Wilmar da Rocha D'Angelis
> lingüista - UNICAMP
>
> > Caríssimos,
> >
> > Sobre toda esta discusão, crei que o único consenso seja que não vivemos
> > em um mundo estático, tudo está em movimento e as sociedades indígenas
> > fazem parte deste todo. Lembro-me que nesta lista foi comemorado o fato
> de
> > termos o primeiro indígena Doutor em Letras ou Lingüística, ora, este
> > universo científico também não fazia parte do mundo indígena e agora
> faz.
> > Assim como, antes, não existiam índios missionários e agora há,
> > entretanto, este fato nós não comemoramos, apenas rechaçamos.
> > Diante disto, creio que haja uma certa falta de reflexão sobre o nosso
> > próprio trabalho junto a essas comunidades.
> > Respondendo a questão do Eduardo existe entre os Wapixana de Roraima um
> > senhor wapixana, que hoje deve estar com 87 anos, que traduziu o novo
> > testamento para a língua wapixana. Não tenho elementos para dizer se a
> > tradução é boa ou ruim, só sei que a base para a tradução foi uma edição
> > de bolso feito para os jovens de linguagem bem simplificada. Como
> > resultado, independente das quentões religiosas, temos um imenso
> > inventário lingüístico (wapixana) reunindo mais de 300 páginas, que
> podem
> > dar margem a diversas análises, lingüísticas, antropológicas, etc.
> >
> > Abraços
> >
> > João Paulo Jeannine A. Carneiro
> >
> > ----- Original Message -----
> > From: Eduardo Ribeiro
> > To: etnolinguistica at yahoogrupos.com.br<etnolinguistica%40yahoogrupos.com.br>
> > Sent: Friday, October 05, 2007 8:34 PM
> > Subject: [etnolinguistica] Missionários, lingüística indígena e a bíblia
> >
> >
> > Caros colegas,
> >
> > A mensagem do Sandro tem o mérito de ampliar a discussão. Afinal, a
> > atuação de lingüistas missionários é apenas uma faceta das relações
> > entre pesquisadores em geral e as comunidades indígenas (e, não menos
> > importante, o papel histórico do Estado e da própria academia). Se
> > queremos avaliar estas questões de maneira racional, é bom que levemos
> > em consideração os fatos e nos abstenhamos de alusões históricas pouco
> > relevantes. Falar da inquisição, mencionar os crimes cometidos em nome
> > de Deus, pode até vir ao caso, se estamos prontos para admitir também
> > que alguns dos piores crimes dos últimos séculos foram cometidos em nome
> > da ciência (ou pseudo-ciência). Fanatismo, seja com verniz religioso ou
> > científico, é sempre uma má idéia.
> >
> > Criticar missionário é tarefa fácil. Mais fácil ainda (dado o ambiente
> > favorável) é formar um coro anti-missionário, com palavras de ordem,
> > "fora isso", "basta daquilo", à la PC do B. Mas não nos esqueçamos que
> > esta é uma lista de discussão sobre o estudo científico de línguas
> > indígenas; eu, como assinante da lista, esperaria que cada mensagem
> > contribuísse com um mínimo de informação adicional, que seja relevante
> > para os demais usuários. Opiniões são, naturalmente, bem vindas, mas é
> > bom que sejam motivadas por preocupações concretas, calcadas na
> > experiência profissional de cada um (como Renato Athias, em sua mensagem
> > original, fez). Uma aversão pessoal, pura e simples, a missionários, ou
> > à religião, não seria razão suficiente. Do contrário, corremos o risco
> > de cairmos no simplismo -- que é, infelizmente, o rumo que esta
> > "discussão" está tomando, na minha opinião.
> >
> > Lamentar que as culturas indígenas estejam mudando é ignorar o óbvio:
> > toda e qualquer cultura muda (e tentativas de mantê-las puras facilmente
> > descambam para o fascismo). Por mais paradoxal que isto pareça, mudança
> > pode ser um sinal de vitalidade cultural. Basta dar uma olhada nos
> > vários empréstimos pré-colombianos espalhados pelas línguas do
> > continente para ver que, por mais "isoladas" que tais culturas fossem,
> > sempre havia intercâmbios culturais -- e, com eles, mudança. Lamentável
> > é quando tais mudanças se dão por imposição, seja à força de armas ou do
> > poderio econômico. Neste caso, a principal crítica que tenho com relação
> > aos missionários diz respeito ao seu oportunismo: acabam se beneficiando
> > das vicissitudes históricas dos índios (massacres, doenças, penúria,
> > descaso das autoridades) para atingir seus objetivos. O que aconteceria
> > se ambas as culturas se encarassem como iguais?
> >
> > Uma questão que considero interessante, no caso de traduções bíblicas,
> > diz respeito ao grau de adaptação cultural alcançado (ou alcançável).
> > Imagino que, entre os evangélicos, haveria pouco espaço para isto,
> > embora eu desconheça as possíveis regras que norteiam seus esforços de
> > tradução (alguém saberia?). E como os textos são traduzidos por
> > missionários estrangeiros, vindos de uma tradição cultural completamente
> > alheia, o texto bíblico acaba sendo uma espécie de aberração -- uma
> > pereba cultural, digamos. Este parece ser o cenário mais comum, mas
> > estou interessado em exemplos de um cenário alternativo: traduções,
> > parciais que sejam, feitas espontaneamente por falantes nativos (sem a
> > coordenação de indivíduos alheios à comunidade). Haveria exemplos deste
> > tipo, no caso das Américas?
> >
> > Abraços,
> >
> > Eduardo
> > (http://kawina.wordpress.com)
> >
> >
> >
> >
> > On 10/4/07, C. Sandro Campos <csampos at yahoo.de <csampos%40yahoo.de> >
> wrote:
> > Ainda apenas para botar mais lenha na fogueira que acenderam, gostaria
> > de fazer uma pergunta que não me deixa em paz: a presença intensa de
> > pesquisadores em áreas indígenas, a profusão de projetos sobre vários
> > temas propostos aos índios, criação de cursos universitários,
> > surgimento de cargos remunerados de professores nas aldeias, manejo
> > com câmeras, encontros indígenas, além do surgimento entre os índios
> > de uma espécie de filosofia de levar vantagem em tudo (conseqüência
> > talvez das nossas constantes e lucrativas ofertas) não são também tão
> > nefastos quanto a tentativa por missionários de levar aos índios "a
> > mensagem de Deus"? Faço a comparação porque, como vejo, também essas
> > ações que fazemos acontecer descaracterizam a cultura e a rotina dos
> > índios...
> > Adianto que não sou religioso e muito menos missionário, quero apenas
> > debater sobre o tema de modo mais crítico.
> > Aguardo...
> >
> > Valdir Vegini < vvegini at gmail.com <vvegini%40gmail.com>> schrieb:
> >
> > Apenas para botar mais lenha na fogueira, aqui força de expressão e
> > não aquele método milhares de vezes utilizado pelos catesquisas
> > durante longo período da cristianização das almas atéias: quando
> > Colombo chegou às Índias Ocidentais notou que os "selvagens" viviam
> > em harmonia e felizes, mas faltava-lhes a conversão ao cristianismo!
> > Pra quê? Recentemente, o banzer do Vaticano afirmou os indígenas
> > foram atraídos e não catequisados. Alguém ainda acredita nisso além
> > dos vaticanólogos??????????
> >
> >
> > Em 01/10/07, Victor A. Petrucci <vicpetru at hotmail.com<vicpetru%40hotmail.com>>
> escreveu:
> > Caros Amigos Listeiros
> >
> > Mais de uma vez pronunciei-me sobre a presença de missionários em
> > terras indígenas e quanto mais leio e pesquiso mais tenho certeza
> > de
> > que isso é inaceitável. A tentatíva espúria de substituir o
> > Estado, de
> > dar apoio às carências de nossos irmãos indígenas é apenas a cunha
> > para dominá-los com as idéias também espúrias de um deus
> > alienígena.
> >
> > É necessário nos posicionarmos claramente sobre isso.
> >
> > Defender suas culturas, preservar suas línguas são ações
> > incompatíveis
> > com um trabalho missionário catequético. Sabemos que essa
> > catequese é
> > radical e interfere profundamente na vida das comunidades.
> >
> > Veja o trecho de uma brilhante tese de mestrado recentemente
> > divulgada
> > em nossa lista, dedicada ao estudo da fonologia Taurepang, que nos
> > dá
> > um exemplo real do que ocorre:
> >
> > "2.5 - A evangelização e sua importância na vida dos índios
> > Taurepang"
> >
> > "No que se refere à religião, os Taurepang do lado brasileiro são
> > praticantes da religião Adventista do Sétimo Dia. Os dias de
> > sábado
> > são guardados zelosamente para a prática do culto, que ocorrem em
> > língua indígena e em português ou espanhol, dependendo da
> > competência
> > comunicativa dos falantes. A vida deste grupo está marcada pelas
> > outrinas e atividades da igreja. Da mesma forma, os hábitos
> > Alimentícios são orientados por meio da religião. A prática
> > adventista
> > proíbe-lhes a pajelança, antiga prática xamanística anterior ao
> > contato com os missionários, que consiste na invocação dos
> > espíritos
> > para promover um ato de cura..."
> >
> > KATIA NEPOMUCENO PESSOA (2006 - RECIFE)
> >
> > FONOLOGIA TAUREPANG E COMPARAÇÃO PRELIMINAR DA FONOLOGIA DE
> > LÍNGUAS DO
> > GRUPO PEMÓNG (FAMÍLIA CARIBE
> >
> > Katia parabéns por sua coragem de tocar no assunto.
> >
> > Exemplos como este existem às centenas. Alguém pode imaginar uma
> > cultura sem pajelança? O que significa uma comunidade indígena com
> > regras alimentares impostas sem respeito? O que significa ter que
> > banhar-se com roupa como os amigos citaram em mensagens
> > anteriores? O
> > que significa a presença nefasta de missionários no dia a dia das
> > comunidades?
> >
> > Até quando vão nos empulhar com pílulas douradas quando vemos que
> > as
> > culturas estão sendo destruídas por fanáticos religiosos. Onde
> > está a
> > FUNAI que não aplica seus próprios estatutos?
> >
> > Nossa mensagem frente a tais agressões e violações dos direitos
> > indígenas é uma só e volto a repetí-la nesta lista:
> >
> > FORA COM A INTERFERÊNCIA RELIGIOSA NAS ÁREAS INDÍGENAS.
> >
> > Estudar língua e cultura indígena é incompatível com alteração de
> > costumes da comunidade.
> >
> > Um abraço a todos.
> >
> > Victor A. Petrucci
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> >
> > ----------------------------------------------------------
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> >
> >
> >
> >
> >
> >
>
> --
> Wilmar R. D'Angelis
> Professor Doutor - Depto de Lingüística
> Instituto de Estudos da Linguagem - IEL
> UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas)
> Estado de São Paulo - Brasil
>
> 
>
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