Imprensa: "Palavras muito usad as não têm som alterado" [sic!]

Eduardo Ribeiro kariri at GMAIL.COM
Thu Oct 11 20:26:13 UTC 2007


Prezados,

Vejam só a nota abaixo, publicada no Estadão e divulgada através do JC
Online. Em princípio, pensei que se tratasse de um estudo revolucionário,
que poria em cheque aspectos da teoria da gramaticalização e muito do que se
tem aprendido nos últimos dois séculos de lingüística histórica.

A começar pelo título, a matéria dá a parecer que o estudo, publicado na
revista Nature, conclui que "quanto mais uma palavra é usada, menos o som
que a representa muda". Lendo o resto da nota, percebe-se que o jornalista
parece confundir alteração da forma fonológica de uma palavra com a sua
substituição por outra. Palavras de alta freqüência mudam sim, e muito -- a
ponto de se tornarem irreconhecíveis. Mas, ao mesmo tempo, tendem a ser
substituídas com menos freqüência.

Se isto é tudo, o estudo, então, não chega a nenhuma novidade bombástica (se
bem que eu gostaria de ler o artigo da Nature para ver qual a contribuição
original do artigo). A idéia de que há partes do vocabulário que são mais
estáveis (ou seja, são substituídas menos rapidamente que outras) é a razão
que subjaz, entre outras, à lista de Swadesh, na qual muitos se baseiam para
diagnósticos de parentesco e de profundidade temporal de famílias
lingüísticas.

Atenciosamente,

Eduardo
http://kawina.wordpress.com

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*Palavras muito usadas não têm som alterado*  * *
   Estudo com 87 línguas mostra que, quanto mais uma palavra é usada, menos
o som que a representa muda

Carlos Orsi escreve para "O Estado de SP":

Muitas coisas desgastam-se com o uso, mas palavras definitivamente não estão
nessa lista. Estudo com 87 línguas (incluindo o português) e análise
estatística cuidadosa do vocabulário de quatro delas – inglês, espanhol,
russo e grego – mostra que, quanto mais uma palavra é usada, menos o som que
a representa muda.

Publicado na revista Nature, o trabalho analisa a taxa de mutação de
palavras que têm som e significado similares em diferentes idiomas
descendentes do indo-europeu, linguagem pré-histórica que deu origem à maior
parte das línguas faladas no Ocidente e a algumas orientais, como o
sânscrito.

A conclusão é que, quanto mais uma combinação de som e significado é usada
hoje, menos ela terá mudado na evolução do indo-europeu até sua forma atual,
processo que pode ter levado de 6 mil a 10 mil anos. No gráfico de taxas de
mutação, as palavras menos substituídas são as que expressam números, como
"dois" (0,09 substituição em 10 mil anos) e pronomes, como "eu".

"Algumas palavras evoluem mais devagar que muitos genes", diz o coordenador
do estudo, Mark Pagel, do Instituto Santa Fé (EUA) e da Universidade de
Reading (Reino Unido). Mudanças do vocábulo "dois" fixaram-se mais devagar
do que mutações no gene que permite que adultos digiram leite.
(O Estado de SP, 11/10)
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