Imprensa: "Inventário terá todo s os idiomas falados no Brasil"
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Wed Jun 4 20:06:20 UTC 2008
Matéria publicado no *Estado de São Paulo* de hoje (4/jun/2008)
http://www.estado.com.br/editorias/2008/06/04/ger-1.93.7.20080604.1.1.xml
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*Inventário terá todos os idiomas falados no Brasil *
*Com levantamento inédito de diversidade lingüística, Iphan pretende
preservar patrimônio imaterial*
*Eduardo Kattah, BELO HORIZONTE*
Mapear centenas de línguas faladas no Brasil, à exceção do português, e
retirá-las de uma espécie de "clandestinidade simbólica" é o objetivo de um
inventário que começará a ser feito ainda este ano no País. O Conselho
Consultivo do Patrimônio Cultural do Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (Iphan) aprovou, em Belo Horizonte no último dia 15, a
realização do levantamento, com base nas conclusões de um grupo de trabalho
que se reuniu durante um ano e oito meses para discutir o assunto. O
inventário deverá contemplar línguas indígenas, afro-brasileiras e de
imigrantes, além das variedades do próprio português. Para iniciar o
trabalho, o Iphan dispõe de um orçamento, em 2008, de R$ 450 mil.
"Embora sejamos vistos pelo exterior e por nós próprios como um país de uma
língua só, na realidade não é isso que ocorre", destaca Márcia Sant'Anna,
diretora do Departamento de Patrimônio Imaterial do Iphan.
"O interessante é que dentro dessa nossa unidade lingüística - que existe em
torno do português - temos ainda um patrimônio importante até em termos
mundiais." Parte desse patrimônio, porém, está sob ameaça de
desaparecimento, pela falta de registro e de formas de transmissão. Não
raro, observa Márcia, algumas línguas indígenas acabam restritas a grupos de
poucas dezenas de pessoas. A estimativa é que existam cerca de 180 línguas
indígenas que ainda são faladas no Brasil. "Em torno de 60 dessas línguas
estão em risco de extinção", afirma a diretora do Iphan.
O lingüista Denny Moore, do Museu Paraense Emílio Goeldi - instituição
vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia -, porém, fez um
levantamento mais recente e acredita que o número de línguas indígenas
faladas no País não passa de 150. Do total, cerca de 25% estão ameaçados de
desaparecimento "em curto prazo", afirma o pesquisador americano, radicado
em Belém (PA) há mais de duas décadas. "Faltam informações sobre o número
exato de línguas, de falantes dessas línguas", diz.
*FALTA DE DADOS
*
No caso das línguas de origem afro-brasileira, a carência de informações e
registros ainda é maior, explica a etnolingüista Yeda Pessoa de Castro,
professora da Universidade do Estado da Bahia.
Sistemas lexicais de diferentes línguas africanas, segundo Yeda, foram
preservados pelas religiões afro-brasileiras como marca litúrgica. Mas, de
acordo com a pesquisadora, nenhuma língua original da África continua sendo
falada no País, nem em comunidades de remanescentes de quilombos.
Nas comunidades quilombolas, as diversidades lingüísticas costumam ser
chamadas de gira, como a da Tabatinga, em Bom Despacho, na região
centro-oeste de Minas. Conforme pesquisadores, a Gira da Tabatinga é uma
espécie de mistura do português rural do Brasil Colônia e línguas do chamado
grupo Banto, entre elas algumas que seriam faladas até hoje em Angola.
Yeda observa que as cerca de 500 línguas faladas pelo grupo Banto na região
central e sul da África foram as que mais influenciaram o português do
Brasil. Ela estima que mais de 3 mil palavras acabaram incorporadas, entre
elas samba, caçula, cachimbo, cochilar etc. Mas, para a pesquisadora, as
línguas africanas no Brasil foram historicamente "desprezadas." "Quais
universidades se dedicam a pesquisas?", questiona. "São vistas como línguas
que nem faladas eram. Parece que os 4 milhões de africanos trazidos para cá
eram mudos."
*IMIGRAÇÃO*
Já as chamadas línguas de imigração, conforme a diretora do Iphan,
promoveram uma situação inusitada - de falares derivados de outros países e
que são considerados únicos. É o caso da língua Talian, originada de
dialetos de imigrantes da região de Vêneto, no norte da Itália, que no final
do século 19 se estabeleceram, sobretudo, na região das Serras Gaúchas, no
Rio Grande do Sul. "Por aqui, esse dialeto sofreu alterações. Hoje é vista
pelos estudiosos como uma língua unicamente falada no Brasil", afirma
Márcia.
Conforme a diretora do Iphan, os estudos preliminares indicam que há entre
25 e 30 línguas de imigração no Brasil.
Quanto às variações do próprio português, o inventário pretende avaliar com
mais profundidade as diversidades da língua oficial conforme as diferentes
regiões e classes sociais. "A idéia é que esse instrumento produza
conhecimento sobre diversidade, mas também já seja uma forma de
reconhecimento patrimonial", diz Márcia.
*CENSO LINGÜÍSTICO*
Segundo a diretora do Iphan, o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) deve incluir no questionário do Censo 2010 uma pergunta
para estimar com mais precisão o número de falantes de outras línguas no
País. "Seria uma pergunta como: 'Além do português que outra língua se fala
em casa'", explica Márcia.
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