Imprensa: "Guia traduz os nomes tupis de São Paulo"

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Sat Jun 14 12:52:01 UTC 2008


Matéria de *O Estado de São Paulo*, 6/jun/2008
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*Guia traduz os nomes tupis de São Paulo*

Lançado nesta semana, livro de guia de turismo compila os significados de
nomes de bairros e ruas da capital, derivados do idioma nativo

*Moacir Assunção*

Vera Lúcia Dias, de 56 anos, especializada em turismo cultural em São Paulo,
conhece bem a cidade. Mas eis que, há cinco anos, uma turista portuguesa
lançava uma pergunta, que viraria desafio: "O que significa Maracanã?" Ela
não sabia. Como também não sabia a origem de outras palavras que despertavam
a curiosidade dos turistas. Eles queriam saber o que significava pacaembu
(rio das pacas), tucuruvi (gafanhoto verde), anhangabaú (bebedouro do
demônio), jaçanã (galinha d'água), tatuapé (caminho do tatu), anhangüera
(diabo velho), itaquera (pedra a dormir), guaianazes (parente), ipiranga
(riacho vermelho), jabaquara (esconderijo de negros fugidos), morumbi (mosca
verde) e ibirapuera (madeira podre).

Para não silenciar novamente, ela pesquisou. Do estudo, surgiu o livro O
Tupi em São Paulo, Vocabulário de Nomes Tupis nos Bairros Paulistanos
(Editora Plêiades), lançado nesta semana.

Descendente de clássicos como Vocabulário Tupi-Guarani Português, de
Silveira Bueno, e Gramática da Língua Tupi, de Teodoro Sampaio, a obra, de
apenas 50 páginas, tem como objetivo introduzir turistas e paulistanos na
língua dos nativos. Até meados do século 18, só se falava em tupi ou em sua
variação, a língua geral nheengatu, na cidade, então pobre povoação perdida
no planalto de Piratininga (peixe seco). A autora, que nasceu na Mooca
(fazer casa, em tupi), também freqüentou o curso de tupi antigo oferecido
pelo professor Eduardo de Almeida Navarro, da Faculdade de Letras da
Universidade de São Paulo (USP).

Descobriu que os nomes de boa parte dos 2 mil microbairros paulistanos têm
origem em dois troncos: no tupi, casos de alguns dos mais antigos, e no
português, ligado à religião, como Santo Amaro, Penha, Freguesia do Ó e
Santana. Com relação às ruas, há enorme quantidade delas com nomes
indígenas. "As pessoas, de maneira geral, não sabem o que significa o nome
de seus bairros. Tenho percebido, para meu espanto, jovens que nem sabem
onde nasceram", diz ela. Nesse desconhecimento pode estar a chave, para a
guia, de um certo desamor do paulistano pela cidade.

Até ela se surpreendeu: pensava que palavras como Sacomã e Nhocuné eram de
origem indígena. São o sobrenome de uma família francesa, os Saccoman, que
povoaram o bairro da zona sul, e uma contração da expressão "sinhô coroné",
usada pelos escravos para se referir ao coronel Christalino Luiz da Silva,
dono das terras que geraram a área, na zona leste.

"O que mais me dá prazer é quando alguém, depois de conhecer o significado
do nome do seu bairro, se interessa em pesquisar mais sobre a cidade",
comenta Vera, de pouco mais de 1,50 metro e cabelos curtos, que há dez anos
leva turistas a lugares inusitados, como o Cemitério da Consolação. "Quando
viajam para o exterior, os turistas brasileiros visitam o cemitério da
Recoleta, em Buenos Aires, e o Père-Lachaise, de Paris. Por que não passear
pelas alamedas de um lugar que conta a história de São Paulo, como o
Consolação?"

Vera faz questão de dedicar seu trabalho aos índios guaranis, língua do
tronco tupi, das três aldeias que sobrevivem na cidade - duas em
Parelheiros, a Crucutu e a Morro da Saudade, e a terceira no Pico do
Jaraguá. Sua tristeza é constatar que São Paulo, que deve sua toponímia e
geografia, além da língua e de vários hábitos, aos índios, não reservou
nenhum espaço para eles no centro. "Os turistas se espantam quando a gente
fala que ainda há índios em São Paulo, mas vê-los sentados na Praça da Sé,
vendendo artesanato, me dói no coração."

Para entrar no clima, ela saúda os turistas com a tradicional "dereco-porã?"
(tudo bem?, em guarani). A propósito, Maracanã é um tipo de arara, um
papagaio amarelo antigamente comum nas matas brasileiras, assim como a
variedade canindé, que dá nome a um bairro e a um estádio paulistanos.


*VOCABULÁRIO TUPI
*
Butantã - terra dura

Cangaíba - dor de cabeça

Carandiru - cesto de flores

Congonhas - erva mate

Cupecê - língua partida

Grajaú - macaco preto

Guarapiranga - garça vermelha

Imirim - rio pequeno

Iguatemi - verde escuro

Itaim - pedra pequena

Jaguaré - lugar onde havia onças

Jaraguá - o senhor do vale

Mauá - coisa elevada

Moema - doce

Tamanduateí - rio de muitas voltas

Tamoio - bisavô

Tutóia - Oh, lindo
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