Decreto reconhece "existência" formal de todas po pulações tradicionais ]
Nylda Rodriguez
nyldarodriguez at UOL.COM.BR
Sat Feb 10 02:30:57 UTC 2007
Decreto presidencial reconhece de forma pioneira "existência" formal de todas as populações tradicionais
Com o Decreto presidencial 6.040, publicado no Diário Oficial da União ontem (7), o governo brasileiro reconhece formalmente, pela primeira vez na história do País, a existência formal de todas as chamadas populações "tradicionais" do Brasil. Ao longo dos seis artigos do decreto,
que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e
Comunidades Tradicionais (PNPCT), o governo estende um reconhecimento feito
parcialmente, na Constituição de 1988, apenas aos indígenas e aos
quilombolas. As negociações que culminaram no decreto tiveram participação direta da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e do ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias.
Daqui em diante, todas as políticas públicas, decorrentes da PNPCT,
beneficiarão oficialmente o conjunto das populações tradicionais, incluindo
ainda faxinenses (que plantam mate e criam porcos), comunidade de "fundo de
pasto", geraizeiros (habitantes do sertão), pantaneiros, caiçaras (pescadores
do mar), ribeirinhos, seringueiros, castanheiros, quebradeiras de coco de
babaçu, ciganos, dentre outras.
Tais políticas serão desenvolvidas pela Comissão Nacional de Desenvolvimento
Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT). "Elas terão como
objetivo central promover o desenvolvimento sustentável, com ênfase no
reconhecimento, fortalecimento e garantia dos direitos territoriais, sociais,
ambientais, econômicos e culturais, além de respeito à valorização de
identidade daquelas populações, às suas formas de organização e às suas
instituições", sublinhou o diretor de Agro-extrativismo do Ministério do Meio
Ambiente, Jorge Zimmermann.
Definição - Segundo o artigo 3 do decreto, povos e comunidades
tradicionais "são grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como
tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam
territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural,
social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações
e práticas geradas e transmitidas pela tradição.
Tais populações - a maior parte sem documentos de identidade, totalmente à
margem dos direitos civis - habitam sobre um quarto do território brasileiro,
em todas as regiões do País, formando um contingente de cerca de 5 milhões de
pessoas, equivalente à população de muitos países europeus. "De forma
inédita, o governo brasileiro reconhece o Brasil como um estado pluriétnico;
assim, abre possibilidades de gestão mais enriquecedora para o conjunto da
sua população", disse Zimmermann.
Ações - Com base na Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos
Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), as várias instâncias do governo
federal, de forma integrada entre si e com as lideranças das comunidades
tradicionais, poderão, juntas, desenvolver planos, projetos e ações
destinadas a promover a inclusão daquelas populações.
Muitas ações nesse sentido já são desenvolvidas hoje, como, por exemplo, as
Reservas Extrativistas (Resex), criadas e geridas pelo Ibama. "Mas, de agora
para a frente, aquelas ações poderão ser realizadas de forma ainda mais
articulada dentro do governo e, por isso mesmo, ter seus efeitos
potencializados. O trabalho buscará sempre o desenvolvimento sustentável, ou
seja, o uso equilibrado dos recursos naturais", enfatiza o diretor.
Eixos - Segundo Zimmermann, são três as diretrizes centrais da PNPCT. A
primeiro delas pretende assegurar todos os direitos civis, por meio do
reconhecimento legal dos habitantes daqueles habitantes, inclusive com
fornecimento de documentos de identificação; a segunda diretriz diz respeito
ao reconhecimento explícito do respeito à diversidade étnica, ao direito à
educação diferenciada e à prática religiosa específica. A terceira perna do
tripé pretende equacionar a regularização fundiária, já que muitas das
comunidades tradicionais sofrem com o desrespeito à sua referência
geográfica, como é o caso dos quilombolas, que, em muitos casos, foram
incorporados pelas cidades, sofrendo achaques da especulação imobiliária.
"Havia uma ausência de marcos legais que garantissem direitos às populações
tradicionais. Agora, porém, com o decreto, temos uma situação em que, com
amparo da PNPCT, podemos transformar a realidade daqueles povos
positivamente", diz Zimmermann. Até porque, insiste ele, o País vive um
momento em que a especificação profissional e as novas tecnologias roubaram
praticamente todos os espaços para a migração das populações tradicionais da
zona rural para as cidades. Com o PNPCT, o governo pretende criar condições
para que aquelas pessoas encontrem maneira de viver digna em seu próprio meio
ambiente.
Uma das primeiras providências, segundo o diretor, será tentar incluir as
ações integradas (governo/populações) no Plano Plurianual (PPA), o que
possibilitaria estruturar melhor atividades voltadas àquela população,
inclusive pela vinculação de dotação orçamentária.
Até a redação do texto do decreto, foi um longo processo de discussão. Numa
comissão democrática, que juntou 15 representantes de vários setores do
governo e 15 representantes das comunidades tradicionais, as sugestões e
críticas de todos foram colhidas no período de um ano. Foram cinco grandes
reuniões regionais, realizadas no Acre, no Pará, em Pernambuco, no Paraná e
na Bahia. "No decorrer dos encontros, a sensação foi de que aos poucos,
juntos, aquelas comunidades foram sendo retiradas da invisibilidade", diz
Zimmermann
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