Dicionário decifra palavras indígenas do dia-a-dia
Paulo Bagdonas
paulo_dois at YAHOO.COM.BR
Thu Jul 24 13:38:45 UTC 2008
A notícia abaixo foi publicada no jornal Folha de São Paulo em 24/julho, no endereço http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2407200834.htm
Dicionário decifra palavras indígenas do dia-a-dia
Paçoca, tapera, Morumbi e outras palavras de origem indígena estão na obra
"Não é um trabalho acadêmico. É o livro de um curioso", afirma o autor, Clovis Chiaradia, médico e etimologista amador
WILLIAN VIEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
Essa é uma obra que vai "das
aldeias para as prateleiras", diz
o autor, Clovis Chiaradia, 73,
também médico e anestesista
-que já foi prefeito e vice de
Ourinhos (SP) pelo PMDB e
aproveitou seus 30 anos de etimologista amador para escrever o livro de sua vida: o dicionário indígena-português, com
30 mil verbetes, que lançará no
mês que vem.
Seu "Dicionário de Palavras
Brasileiras de Origem Indígena", apressa-se em frisar, "não
é um trabalho acadêmico", pois
desses já há muitos nas bibliotecas. "É o livro de um curioso",
que desde os dez anos se maravilhava com a pronúncia da cidade natal, Botucatu (SP), "que
quer dizer "bons ares'".
Botucatu foi a primeira palavra anotada em seus cadernos,
que ganharam caráter profissional há três décadas, quando
passou a visitar bibliotecas (como a Nacional do Rio e a Mário
de Andrade em SP); a pesquisar
em revistas e livros de viajantes; e a dissecar dicionários à
procura de menções etimológicas às famílias lingüísticas tupi-guarani, aruaque, caribe e jê.
A cada viagem que fazia, suas
anotações foram engrossando
-hoje são pilhas espalhadas
pela casa. "Pegue "tapera", por
exemplo. Do norte ao sul do
Brasil, tem várias cidades com
esse nome", diz Chiaradia. A
palavra significa aldeia velha.
"O meu [dicionário] é popular, no estilo de Teodoro Sampaio, só que mais amplo", diz,
em referência ao livro "O Tupi
na Geografia Nacional", obra
consagrada do começo do século passado.
Por que o público deveria
comprar seu livro é uma resposta que Chiaradia tem na
ponta da língua: "É por causa da
brasilidade". Afinal, são muitas
as palavras do dia-a-dia do brasileiro com origem nas línguas
nativas: de paçoca e caipira a
Guarujá e Morumbi.
Um dos pontos levantados
no prefácio do livro conta que o
tupi chegou a ser a língua corrente entre os brasileiros no século 17, quando a catequese dos
jesuítas e a comunicação do
dia-a-dia eram feitas na língua
"brasílica". Só no século 18 é
que as proibições do marquês
de Pombal garantiram o português como língua comum.
A "proibição", para Chiaradia, foi financeira -pronto há
oito anos, o dicionário só saiu
da gaveta porque um amigo na
editora Limiar conseguiu o patrocínio da Petrobras.
Biografia extensa
"É uma boa forma de divulgar o que está embolado na academia", diz a
professora de toponímia indígena da USP, Maria Vicentina Dick, ao
analisar trechos do dicionário.
"Claro que o ideal seria fazer
uma separação por tronco lingüístico e região do país", pondera. Na obra, palavras de origens diversas estão agrupadas
por ordem alfabética. "Mas é
válido por divulgar vestígios
das línguas faladas."
Chiaradia não pensa em ficar
famoso como autor de livro
-fama já tem, ao menos em
Ourinhos, onde atende há mais
de 40 anos como médico (hoje
anestesista da Santa Casa) e como político.
E olha que ele quase foi padre, cursou até o seminário, até
começar um curso de geologia,
que não terminou por falta de
dinheiro. Formado em medicina, desde então vive em Ourinhos. Mas não quer voltar à política e, agora que desovou as
anotações de uma vida, pretende viver de medicina.
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