coment=?utf-8?Q?=C3=A1rio_=C3=A0_cr=C3=ADtica_da_Profa._Maria_Carlota_Rosa_=C3?= =?utf-8?Q?=A0_recens=C3=A3o_?=do livro de Aline Cruz
Eduardo de Almeida Navarro
edalnava at YAHOO.COM.BR
Mon Feb 20 23:24:51 UTC 2012
Prezada professora Carlota,
O livro de Aline Cruz não é ótimo, não. O mal da universidade hodierna é que muitos se contentam com a mediania e mediania no meio acadêmico não merece louvor. Aline Cruz foi paga com dinheiro público para estudar na Europa e, portanto, não praticou nenhuma ação meritória ao escrever uma tese, e tese cheia de erros, como eu mostrei com fatos. Com efeito, idealismo é o que menos se vê na universidade de hoje, onde não se dá um passo sequer sem financiamentos, bolsas etc. Produtivismo, desinteresse pelo ensino, carreirismo, avidez por cargos burocráticos e verbas, corporativismo, essa é a universidade brasileira e a de muitos países atualmente.
O grande problema dessas análises estruturalistas que pululam nas academias (nome honroso para uma realidade tão medíocre...) é que aderem a uma retórica da análise e da descrição em completo menoscabo da normatividade. Despreza-se o estudo dos textos escritos e encarece-se a importância de trabalhos de campo para o conhecimento das línguas vivas. Efetivamente, gramáticas sincrônicas importam aos especialistas, à ciência pura, mas o interesse social delas é, amiúde, muito pequeno. Elas são feitas mais para esses autores arranjarem emprego que para darem uma efetiva contribuição à sociedade. Com efeito, vários caboclos do Rio Negro relataram-me o descaso que os pesquisadores de campo têm para com eles. Depois de escritas suas teses, nada retorna em benefício dos falantes das línguas que aqueles pesquisam.
Se a autora do livro quer fazer Filologia (o que ela chama de "incursões diacrônicas"), então que se prepare adequadamente para isso. Com efeito, o pouco prestígio de que goza a Filologia entre os que se deixam fascinar por modismos explica-se pelo muito trabalho necessário a quem se dedica àquela: domínio de línguas clássicas, estudo diuturno dos seus textos etc. Os tempos de hoje são infensos a isso... Tempos de coisas rápidas, de muita informação, muito conhecimento de INTERNET, pouca profundidade e nenhuma erudição. Ser estruturalista é muito mais fácil e mais rápido que ser filólogo. É como dizia Dante : “In picciol tempo, gran dottor si feo” (“Em pouco tempo fez-se grande doutor.”). Nem mesmo a norma culta do português é ainda respeitada nos textos especializados das Letras e da Linguística e o livro de Cruz é um bom exemplo disso...
A senhora pode sentir alegria em ver a autora "tornar-se uma pesquisadora com um trabalho dessa envergadura". Trabalho de envergadura, na verdade, é outra coisa. Elogios fáceis como os que a senhora teceu só reforçam o espírito corporativista numa instituição dominada pelo tecnicismo e pela desumanização crescente do conhecimento.
Atenciosamente,Eduardo de Almeida Navarro (USP)
----- Mensagem original -----
De: "carlota at ufrj.br" <carlota at ufrj.br>
Para: etnolinguistica at yahoogrupos.com.br
Cc:
Enviadas: Domingo, 19 de Fevereiro de 2012 22:53
Assunto: [etnolinguistica] Livro de Aline Cruz sobre o Nheengatu
Prezado Professor:
Sua resenha ficou a nos dever a exploração dos aspectos que refere no parágrafo inicial:
que o trabalho é "contributo inegável a um campo de estudos onde são escassas as pesquisas";
que, "no que tange à fonologia, é certamente o estudo mais alentado que há sobre o Nheengatu"
Estou com o trabalho em mãos e concordo com o Sr.: é um trabalho de fôlego ( que se propõe a uma descrição da "variedade
moderna"). E certamente se torna de citação obrigatória a partir de agora.
Adiciono um comentário: é com grande alegria que vejo que a menina que conheci num Encontro de Linguística ainda aluna de IC tenha-se
tornado uma pesquisadora com um trabalho dessa envergadura, fazendo linguística de campo.
At.
Maria Carlota Rosa
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