Trumai & Macro-J ê
Eduardo Ribeiro
kariri at GMAIL.COM
Thu Nov 22 18:36:19 UTC 2007
Prezada Raquel,
Muito obrigado pela pronta resposta e pelas informações sobre os contatos
dos Trumai com outros povos indígenas. Pelo que você menciona no seu
trabalho do Boletim (tratando da localização original dos Trumai, a sudeste
do Alto Xingu), os Trumai estariam então em pleno território Macro-Jê (entre
os Bororo, os Karajá e os Jê (Cayapó do Sul)).
Concordo integralmente com o que você diz, sobre a necessidade, para o
trabalho histórico-comparativo, de dados corretos e bem analisados e da
cooperação entre comparativistas e especialistas nas línguas sendo
comparadas. Para mim (como para muitos outros), Greenberg é um exemplo de
como *não* se fazer lingüística comparativa.
Consultando a lista publicada por Karl von den Steinen (p. 540), vê-se que a
palavra para 'pescoço' que eu mencionei como uma das semelhanças com línguas
(Macro-)Jê já estava em uso: *(ya)mut* 'Hals'. Isto aparentemente elimina
(ou pelo menos diminui) a possibilidade de tratar-se de empréstimo do Suyá.
Bem, vou ficado por aqui. Mais uma vez, muito obrigado!
Abraço,
Eduardo
On Nov 22, 2007 9:17 AM, Raquel Guirardello-Damian <
R.Guirardello-Damian at bristol.ac.uk> wrote:
> Caro Eduardo,
>
>
> Achei interessante a colocação que você fez sobre classificação genética
> de linguas isoladas. Gostaria apenas de fazer alguns comentários sobre a
> língua Trumai.
>
> Os Trumai tiveram contatos com povos Macro-Jê tanto no período
> pré-xinguano como no pós-xinguano, mas é difícil dizer se tais contatos
> levaram a empréstimos linguísticos. No período pré-xinguano, houve
> contatos com os Xavante, porém estes eram de natureza hostil. Não havia
> propriamente interação entre os grupos, por isso não parece ter havido
> condições para intercâmbio linguístico. É possível que tenha havido
> contatos também com os Karajá, pois os próprios Trumai reconhecem ter
> alguns traços culturais semelhantes aos deste grupo. Porém, ao se
> consultar a memória dos falantes mais velhos ou documentos históricos
> sobre o povo Trumai, não se encontram maiores informações sobre este
> possível contato.
>
> No período pós-xinguano, os Trumai tiveram interações com os Suyá.
> Inicialmente, tratavam-se de conflitos; posteriormente passaram a haver
> casamentos intertribais. Mas os casamentos entre indivíduos Trumai e Suyá
> aconteceram mais recentemente na história do grupo - por exemplo, os
> casamentos entre Trumai e Kamayurá começaram a ocorrer muito antes. A
> influência da língua Kamayurá sobre o Trumai é visível (há muitos
> empréstimos de origem Kamayurá), mas não me parece que haja empréstimos de
>
> origem Suyá. Esse é um ponto para ser investigado.
>
> Achei interessantes as semelhanças que você apontou entre dados do Trumai
> e dados de línguas Macro-Jê. Em um trabalho de classificação genética, o
> ideal seria ter um conjunto de linguistas envolvidos: um linguista que
> compare as diversas línguas, e os linguistas especializados nas línguas
> individuais. Dessa forma, eles podem trocar informações e fazer uma
> comparação mais precisa.
>
> Digo isso porque anos atrás examinei os dados do Trumai que Greenberg
> utilizou em sua classifição genética (ele empregou a lista de palavras
> obtidas por Von den Steinen). Observei que alguns dos dados tratavam-se de
> palavras morfologicamente complexas, isto é, havia morfemas flexionais na
> palavra. Em alguns casos, Greenberg fez a comparação levando em conta a
> forma inicial da palavra Trumai, mas esta forma não era a raiz da palavra,
> e sim um prefixo flexional. Por exemplo, ele comparou os termos de cores
> do Trumai com termos de outras línguas ameríndias. Para o termo "amarelo",
> ele apresentou os seguintes dados:
>
> Cayuvava: titibo
> Guahibo: tsobia
> Trumai: tsomate
>
>
> Nota-se que os termos comparados têm em comum o som inicial t/ts- (e
> internamente, um som bilabial: b/m). Porém, em Trumai, ts(i)- não faz
> parte do termo para cor; trata-se na verdade de um prefixo de posse. O
> dado empregado por Greenberg não significa simplesmente "amarelo", mas sim
>
> "a (cor) vermelha dele" (o termo na verdade refere-se à cor vermelha).
>
> A meu ver, esse tipo de problema compromete a qualidade da comparação. Por
> isso penso que um linguista que trabalha com dados comparativos deve ter
> contato constante com os especialistas das línguas analisadas, para não
> haver problemas desta natureza. Assim, a comparação e a classificação
> genética
> tornam-se mais sólidas.
>
> Um abraço cordial,
>
> Raquel
>
>
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