Pa'i ' chefe' em J ê: um empréstimo?

Eduardo Ribeiro kariri at GMAIL.COM
Thu Jul 7 18:05:31 UTC 2005


Prezado Sebastian,

Muito obrigado pelas interessantes informações sobre as línguas Tupi. Sua 
mensagem me fez mais otimista com relação à reconstrução de **pa'i* para o 
Proto-Jê, que seria, assim, mais um informação acerca da proto-cultura. [A 
reconstrução de **pa'i* também ajudaria a corroborar uma suspeita minha, a 
de que é possível reconstruir uma consoante glotal para o Proto-Jê, algo que 

Davis não fez.]

Quanto a *pajé* vs. *pa'i* em Tupi[-Guarani], parece-me que são palavras 
diferentes. Ambas ocorrem no dicionário Guarani a que me refiro na minha 
mensagem (enquanto *pa'i* ocorre como 'cura, sacerdote', *paje* ocorre como 
'chamán, brujo, médico') e, aparentemente, ambas ocorriam também no 
Tupinambá. Um mito comumente mencionado na literatura é o de Pa'i Sumé (que 
os jesuítas associaram a São Tomé!); talvez os antropólogos na lista tenham 
mais a dizer a respeito disso. Então, é provável que *pa'i* e *pajé* se 
referissem a entidades distintas, e qualquer hipótese sobre o significado 
original de ambas deve levar isto em consideração.

Quanto à suposta 'afinidade' semântica, o "marcado antagonismo entre shamans 
e chefes" entre os Tupi não é um contra-argumento tão forte assim: quando 
uma palavra é tomada de empréstimo, ela passa a fazer parte das relações 
léxico-semânticas da língua recebedora; o fato de que *lanche* em português 
veio a significar 'snack ', não 'almoço', a despeito do seu significado na 
língua original (inglês *lunch*), é um bom exemplo disso. Além disso, se *
pa'i* 
é de fato uma palavra Tupi (e eu não tenho como afirmar isso, naturalmente), 
seu significado não seria exatamente o mesmo que o de 'shaman' (para o qual 
existe, como você aponta, uma outra palavra, reconstruível: *pajé*).

Lamento os problemas gráficos com minha última mensagem. Vou ver como evitar 
isso no futuro. Para os que tiveram problemas com a legibilidade da 
mensagem, a cópia arquivada no sítio do grupo apresenta os diacríticos 
corretamente:
http://br.groups.yahoo.com/group/etnolinguistica/message/675

Um abraço grato,

Eduardo


PS. A propósito: um possível cognato desta palavra parece ter ocorrido em 
Ofayé também, segundo Nimuendaju (cf. Darcy Ribeiro, 1951:116):

"Nimuendaju ouviu ainda, dos Ofaié, que seus antigos xamãs sabiam evocar os 
*Faí*. Êstes seriam dois irmãos míticos que lhes apareciam sob forma humana, 
vestidos com tangas (os homens Ofaié andavam sempre nús) e ricamente 
ornamentados, para repartir com êles seus adornos de contas. A semelhança do 
nome *faí* com o *paí* dos Guarani e a referência a tangas masculinas, 
sugeriram a Nimuendajú a hipótese de que esta lenda se tivesse originado de 
uma visita histórica dos pagés guaraní [...]"
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